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Marcos Cintra

Um bom imposto em má hora

No debate atual sobre a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira - CPMF, há uma unanimidade: ela deve ser rejeitada, caso imponha maior carga tributária aos contribuintes. A convergência de opiniões termina por aí porque, enquanto alguns especialistas apoiam esse tipo de tributação, seus críticos a repudiam, dizendo que é cumulativo, prejudica as exportações, vai contra os princípios da moderna ciência tributária e contraria o que fazem os outros países.


Há anos, defendo a CPMF como base para a criação de um imposto único e a repudio como um tributo a mais. Trata-se de um bom imposto, cujas críticas devem ser refutadas com veemência.


Quanto à cumulatividade, as recentes teorias da tributação ótima, juntamente com postulados da teoria do segundo melhor, de safra mais antiga, já deveriam ter convencido os economistas de que nada se pode concluir a priori sobre essa questão. Um tributo em cascata, com alíquotas baixas, pode ser melhor, do ponto de vista alocativo, do que tributos sobre valor agregado com alíquotas altas.


Quanto à questão das exportações, é possível desonerá-las, utilizando uma matriz de insumo-produto, a partir das Contas Nacionais produzidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Por meio dessa metodologia, tem-se o peso da carga tributária nos produtos exportados e aí basta fazer rebates fiscais. Por exemplo, no caso da exportação de tratores, obtém-se o ônus tributário que esse produto carrega, e a montadora receberia créditos fiscais para abater do valor que ela tem a recolher.


No tocante à afirmação de que um tributo, como a CPMF, vai contra todos os modernos princípios da ciência tributária e contraria tudo o que fazem os outros países, cumpre dizer que a primeira parte da crítica é falsa e a segunda irrelevante.


Políticos, economistas e tributaristas de boa estirpe, no Brasil e no mundo, apoiam impostos sobre transações financeiras e os recomendam em trabalhos e estudos. Entre os economistas e tributaristas, cito James Tobin (Prêmio Nobel), Rudiger Dornbusch, Edgar Feige (Universidade de Wisconsin), Roberto Campos e Ary Oswaldo Mattos Filho (presidente da Comissão de Reforma Tributária no começo dos anos 90). Entre os políticos, há Flávio Rocha, Luiz Roberto Ponte (autor de emenda de grande popularidade no Congresso), Luiz Carlos Hauly (autor de outra respeitada proposta) e os ex-senadores Paulo Octávio e Jefferson Peres.


Como defensor das qualidade desses tributos, menciono ainda apoios de respeitados membros da esquerda, como Roberto Freire e Maria da Conceição Tavares. Para finalizar, não poderia deixar de citar as inteligências de Everardo Maciel e do ex-ministro Adib Jatene, na defesa de tributos sobre movimentação financeira.


Não importa se outros países não se valem de impostos como a CPMF. Afinal, por que deveríamos apenas copiá-los? Acredito que a CPMF seja um imposto moderno, produto da revolução da informática, e que sua crescente popularidade seja inevitável aqui e em outros países, por ser de baixo custo, insonegável e universal. Teria mais apoio se viesse em substituição aos carcomidos impostos clássicos.


Reafirmo que sempre combati a CPMF não por suas características intrínsecas, que são altamente positivas, mas sim pela forma como foi utilizada e por ser usada pelo governo apenas como mais um reforço para a já excessiva carga tributária brasileira.

 

* Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.


Publicado na Revista Fecontesp - Março/Abril de 2011


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