Publicação: Texto para Discussão 356 — Os custos dos congestionamentos na cidade de São Paulo. EESP/FGV - Abril 2014
RESUMO
Em apenas dez anos, entre 2002 e 2012, 1,6 milhão de carros passaram a circular na cidade de São Paulo. Isso equivale a uma média de 13 mil automóveis a mais todo mês nas ruas do município.
Por outro lado, os investimentos em infraestrutura viária e no transporte coletivo de alta capacidade foram insuficientes para atender o aumento da demanda por locomoção na cidade.
Esse descompasso tornou inevitável a crise de mobilidade no município, causando congestionamentos e implicando em perdas bilionárias de dois tipos: o tempo ocioso das pessoas no trânsito e os gastos pecuniários impostos à sociedade.
A crise de mobilidade em São Paulo custa por ano mais de R$ 40 bilhões, valor equivalente a 1% do PIB brasileiro e 7,5% do PIB paulistano. Reduzir esse desperdício é um desafio aos gestores públicos.
PALAVRAS CHAVES
Trânsito, Custos, Mobilidade, Cidade de São Paulo.
A era das cidades
A Organização das Nações Unidas (ONU) diz em seu relatório “State of the World’s Cities”, 2012 – 2013 que o motor da prosperidade econômica será “o dinamismo e a intensa vitalidade das cidades”. Os centros urbanos, e não os países, é que vão comandar a criação de riquezas no planeta. Para reforçar essa ideia, a entidade afirma que “o bom ambiente urbano é tão determinante no século XXI como a matéria prima foi para a indústria no século XIX”.
O estudo da ONU é um convite para pensar as cidades e colocá-las no centro da agenda dos gestores públicos. Quatro são as vertentes sobre as quais o relatório foi produzido: infraestrutura, produtividade econômica, qualidade de vida, inclusão social e sustentabilidade ambiental. São Paulo é a única cidade brasileira a aparecer na lista.
O relatório da ONU demonstra o grande desafio que os gestores públicos envolvidos com as grandes cidades têm pela frente. A entidade enfatiza a questão do rápido aumento populacional como maior preocupação. Muitas metrópoles já acumulam problemas de toda ordem e a urbanização crescente tende a intensificá-los.
Em São Paulo, principal eixo econômico do Brasil, o aprofundamento de problemas ambientais, sociais e de infraestrutura desembocaria em sérios entraves para a economia de todo o País. A cidade tem hoje onze milhões de habitantes e até 2030 esse contingente deve se aproximar de treze milhões. Serão dois milhões de pessoas a mais em um espaço que já concentra problemas de toda ordem. Mais de 40% dos habitantes moram em imóveis precários (favelas, cortiços e loteamentos irregulares), a água é mais escassa que no sertão nordestino, a reciclagem das doze mil toneladas de lixo coletadas todo dia é insuficiente, metade do esgoto residencial não é tratado e o trânsito caótico gera perdas bilionárias para a sociedade.
A vertente infraestrutura do estudo da ONU contempla um dos maiores entraves a ser enfrentado na cidade de São Paulo. É nesse item que reside a crítica mobilidade dos paulistanos, que compromete severamente outros elementos considerados no estudo, como a produtividade econômica, a qualidade de vida e o meio ambiente.
As perdas geradas pelo trânsito em São Paulo é o ponto central deste estudo. A intenção é que ele contribua para que o poder público, em seus três níveis, o setor produtivo e instituições acadêmicas e de classe pensem a principal cidade do País à luz do estudo da ONU e da conclusão de que o motor da prosperidade econômica serão os centros urbanos.
O peso de São Paulo
São Paulo é a 10ª cidade mais rica do planeta, podendo ocupar o 6º lugar desse ranking até 2025, segundo projeção da empresa de consultoria PriceWaterhouseCoopers . O município é considerado o 14ª mais globalizado do planeta.
A economia paulistana representa 12% do PIB brasileiro e 63% das multinacionais no País têm sua sede na cidade. O município participa com 36% do PIB paulista e produz 60% do valor agregado estadual no setor de serviços e 39% no setor industrial. Tem um dos centros financeiros mais modernos do mundo. A cidade é responsável por mais de 25% da produção científica brasileira e sedia a Bolsa de Mercadorias e Futuro de São Paulo (BM&F Bovespa), a segunda maior bolsa de valores do mundo em valor de mercado. Tal peso faz de São Paulo o principal “motor” da economia brasileira. Fenômenos que afetam a atividade produtiva da cidade impactam fortemente sobre a competitividade do Estado e do País.
A tabela 1 mostra a evolução dos PIBs e da população da cidade de São Paulo e do Brasil no período entre 1999 e 2012. Nela se vê que enquanto o número de pessoas vivendo em seu território representa 6% da população nacional seu PIB tem uma participação de 12% no PIB do País.
A tabela 1 mostra ainda que o paulistano tem uma renda per capita equivalente a duas vezes à observada no País. Cada brasileiro registra renda média anual em torno de R$ 23 mil por ano, enquanto que na cidade de São Paulo esse valor é de pouco mais de 46 mil por ano por habitante.
A expansão da frota paulistana
Segundo o Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo – Detran, a frota paulistana em agosto de 2012 era da ordem de 5,3 milhões de automóveis, enquanto que para o Sistema de Registro Nacional de Veículos Automotores – Renavam/Denatran ela é de 4,8 milhões em setembro do mesmo ano, 11,5% da frota brasileira. Independentemente dessa disparidade dos dados entre os órgãos, o fato é que a relação carro por habitante na cidade aumentou significativamente.
A tabela 2 mostra que entre 2001 e 2012 a frota de automóveis cresceu 54%. Nesse mesmo período a população da cidade, descrita na tabela 1, cresceu 8%. Com isso, o número de carro por habitante saiu de 0,30 para 0,42 no período, sendo que o índice nacional atualmente é de 0,22.
Os dados do Sistema de Registro Nacional de Veículos Automotores Renavan / Denatran revelam que em pouco mais de nove anos a cidade de São Paulo teve um crescimento da frota total de veículos (automóveis, caminhões, utilitários, ônibus, motos, entre outros) acima de 60%. A tabela 3 mostra que entre janeiro de 2003 e setembro de 2012 o número de automóveis no município aumentou 1.557.429 unidades, equivalente a 13.426 por mês ou 447 por dia. Quando se trata da frota total, foram adicionados 2.540.659 veículos, o que equivale a 21.902 por mês ou 730 a mais diariamente no município.
O crescimento da frota de veículos em São Paulo é espantoso, gerando uma concomitante elevação na demanda por vias de circulação. Como em curto prazo a oferta dessas vias é inelástica, e investimentos na infra-estrutura viária e no transporte coletivo de alta capacidade não foram suficientes para criar alternativas de locomoção de bens e de pessoas pelo município, a crise de mobilidade tornou-se inevitável. Vale lembrar que diariamente destinam-se ao território paulistano milhares de veículos originários ou com destino a cidades das regiões metropolitanas da Baixada Santista e de Campinas, entre outras, que contribuem para tornar a situação ainda mais crítica em seus 1500 km2 de área total.
É de conhecimento geral que São Paulo enfrenta uma grave crise de mobilidade em seu território. O trânsito do maior núcleo econômico brasileiro tornou-se caótico e impõe um custo elevado e crescente para o setor produtivo. Pela dimensão que atingiu, e em função das expectativas de agravamento dessa situação, torna-se imperioso que o poder público adote uma postura mais efetiva no enfrentamento do problema, uma vez que essa situação compromete a produtividade da economia e o bem-estar da população.
Na tabela 4 e no gráfico 1 vê-se que após a instituição do rodízio em 1997 houve uma ligeira redução dos congestionamentos nos dois anos seguintes. Entre 1999 e 2000 eles voltaram a crescer, mas o baixo crescimento econômico no período 2002-2003 contribuiu para o declínio da extensão dos engarrafamentos. Entre 2004 e 2007, com a economia crescendo a taxas mais elevadas e com maior volume de crédito, a frota de veículos aumentou de modo acelerado. Em 2008 a lentidão do trânsito cresceu de modo expressivo, atingindo níveis bem acima do verificado no período anterior à adoção do rodízio.
A partir de meados de 2008 medidas de impacto restringindo o trânsito de caminhões foram implementadas pela prefeitura paulistana. Houve ampliação da área e do horário de circulação desses veículos.
No tocante à área de restrição de circulação, a CET informa em boletim técnico a ampliação do perímetro de 25 para 100 quilômetros quadrados e que a nova região ficou totalmente contida no denominado Centro Expandido da cidade. Já em relação ao horário, a proibição passou das 10 horas às 20 horas para 5 horas às 21 horas durante os dias úteis. Com a saída dos caminhões em uma área maior e a ampliação do horário vetado ao trânsito desses veículos, os níveis de lentidão começaram a cair a partir 2009.
Novas restrições à circulação de caminhões foram adotadas em 2010 em determinadas vias, contribuindo para reduzir novamente os índices de congestionamento. No relatório “Impacto de melhorias viárias e medidas de circulação em São Paulo em 2010”, a CET conclui que “a restrição de circulação de caminhões na Marginal Pinheiros, Av. dos Bandeirantes, e Av. Jorn. Roberto Marinho consolidou as melhorias conquistadas pelas inaugurações (da Nova Marginal Tietê e do Rodoanel)”.
Segundo ainda o relatório da CET houve redução expressiva no número de caminhões em importantes vias da cidade com as restrições. Isso explica em parte a ligeira redução na média dos congestionamentos em 2010, que só não foi mais expressiva porque automóveis passaram a ocupar o espaço deixado pelos caminhões. Na marginal Tietê o fluxo de caminhão caiu 6%, mas o de automóveis cresceu 15%; na Avenida dos Bandeirantes foram 44% a menos de caminhão circulando, porém os carros na via cresceram 10%; e na marginal Pinheiros foi reduzido o número de caminhão em 27% e o de automóveis cresceu 7%.
Em 2011 a fila de congestionamento registrou uma nova queda. É provável que isso ainda seja reflexo das medidas de restrição adotadas em 2010.
O custo da crise de mobilidade
Neste estudo procurou-se estimar o custo dos congestionamentos na cidade de São Paulo. Eles são diferenciados em dois tipos: o primeiro se refere ao custo de oportunidade do tempo perdido das pessoas ociosas no trânsito e o segundo trata dos dispêndios monetários causados pela lentidão, mais especificamente os custos adicionais de combustíveis, de transporte de mercadorias e de emissão de poluentes. Há muitos outros custos não considerados nessas estimativas, tais como desgaste de materiais, acidentes, manutenção viária e outros que deveriam ser adicionados em futuros estudos sobre o tema.
Custo de oportunidade
O custo de oportunidade é um valor teórico e está relacionado ao uso alternativo do tempo gasto pela população nos congestionamentos. O ponto de partida foi estimar o valor da hora de trabalho dos paulistanos, cujos parâmetros são apresentados na tabela 5 para anos selecionados. Os valores foram obtidos tendo como referências o PIB e a população economicamente ativa ocupada da cidade de São Paulo.
O cálculo dos congestionamentos utiliza dados da tabela 4. Para os anos de 2008, 2010 e 2012 foi acrescentado mais uma hora, das 20 horas às 21 horas, sendo nesse período estimado um terço do congestionamento médio observado no período da tarde.
Com as extensões conhecidas em cada período foi obtido o total de metros de lentidão e para se obter a extensão dos congestionamentos considerou-se como padrão vias com duas pistas de três vias. Ou seja, multiplicou-se por seis a fila dos congestionamentos.
O resultado da extensão dos congestionamentos foi dividido pelo espaço médio ocupado pelos veículos. Esse espaço foi obtido considerando a frota de automóveis, camioneta, caminhonete, reboque, semi reboque, utilitários, caminhão, ônibus e microônibus da tabela 3. Para cada um desses veículos foi atribuído um tamanho, conforme descrito na tabela A-3 do anexo.
Para os anos de 2010 e 2012 o tamanho médio dos veículos foi reduzido de 4,4 metros para 4,3 metros, conforme resultado na tabela A-4 do anexo, resultado de uma hipótese de retirada de 30% dos caminhões das ruas através de medidas de restrição de circulação desses veículos.
Considerando que cada veículo transporta o equivalente a 3 pessoas obtém-se a quantidade de homens ociosos no trânsito. Esse valor é multiplicado pelo valor da hora de trabalho da PEA, constante da tabela 5, considerado 253 dias úteis no ano.
A metodologia de cálculo que resultou na tabela 6 revela que entre 2002 e 2012 o custo de oportunidade dos congestionamentos no trânsito da cidade de São Paulo triplicou nominalmente, passando de R$ 10,3 bilhões para R$ 30,2 bilhões. Em relação ao PIB paulistano houve um crescimento desse custo de 5,5% em 2002 para 6,8% em 2008 e em 2010 essa participação era declinante até retornar em 2012 aos níveis de cerca de 10 anos atrás.
Custos pecuniários
Os custos pecuniários do congestionamento foram estimados a partir de funções contidas em um estudo coordenado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com a Associação Nacional de Transporte Público (ANTP) que têm como variáveis dependentes o consumo de combustível e a emissão de poluentes, e como variável independente a velocidade de circulação dos veículos.
Para estimativas do custo adicional de combustível causado pelos congestionamentos foi adotada a hipótese de uma distância média de 30 km percorrida diariamente por automóveis durante 210 dias (253 dias úteis menos 43 dias de rodízio) e o preço da gasolina de R$ 2,60/litro, conforme dados da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), disponível em: http://www.anp.gov.br/preco/ (Acessado em 05/12/2012. No caso dos ônibus considerou-se um percurso médio de 180 km por dia durante 300 dias e uma média de 70 pessoas transportadas por viagem. O custo do diesel foi estimado em R$ 1,70 por litro, preço considerado para grandes consumidores como descrito em: http://www9.prefeitura.sp.gov.br/spMovimento/dadoseconomicos/precinsumo.php. (Acessado em 11/12/2012.)
O custo relacionado à poluição se refere aos seus reflexos sobre a saúde das pessoas. São despesas impostas à sociedade por conta dos efeitos dos poluentes sobre o organismo da população como doenças respiratórias, alergias, irritações de órgãos entre outros.
Em ambos os casos foram comparados situações sem congestionamento e com lentidão. Para os carros considerou-se a hipótese de uma velocidade média de 50 km/h e para os ônibus de 30 km/h, em situação de ausência de congestionamento, nos anos em consideração. Essa velocidade foi considerada para os períodos da manhã e da tarde. Para o cenário dos veículos em cada ano foram consideradas as velocidades conforme a
tabela 7.
A tabela 7 mostra que de 2003 até 2007 a velocidade media decrescia. Entre 2008 e 2010 essa situação apresentou uma ligeira reversão, período em que restrições ao tráfego de caminhões começaram a ser adotadas. Em 2011 a velocidade voltou a cair levemente, uma vez que mais automóveis começaram a ocupar o espaço deixado pelos caminhões. Os dados de 2012 foram estimados considerando a manutenção do registrado no ano anterior.
Para o cálculo do consumo de combustível e do custo dos poluentes para os ônibus foram utilizados dados da tabela 8.
As funções utilizadas para os cálculos do consumo de combustíveis e emissão de poluentes para automóveis e ônibus, assim como os valores monetários referentes aos poluentes, são:
Função de consumo de combustíveis pelos carros
C = 0,09543 + 1,26643 / V – 0,00029 V
Onde:
C = Consumo (l/km)
V = Velocidade (km/h)
Função de consumo de diesel pelos ônibus
C = 0,44428 + 0,00008 V2 - 0,00708 V + 1,37911 / V + 0,00107 carro
Onde:
V = velocidade (km/h)
C = Consumo (l / km)
Carr = carregamento (sentado + em pé)
Função da emissão de poluentes para os carros
Para o cálculo da emissão de poluentes pelos carros foram considerados os que mais provocam danos à saúde. São eles: Monóxido de Carbono (CO), Hidrocarbonetos (HC) e Óxido de Nitrogênio (NOx).
Hidrocarbonetos: HC (g/km) = -028 + 62,48 / V
Monóxido de Carbono: CO (g/km) = -4,51 + 727 / V + 1,34 x 10 -3 x V2
Óxido de Nitrogênio: NOx (g/km) = 1,03 + 7,477 x 10-5 x V2
Onde V = Velocidade
Função da emissão de poluentes para os ônibus
Para o cálculo da emissão para os ônibus foram adicionados os “particulados”.
HC (g/km) = 14,14 – 3,67 ln V
Co (g/km) = 43,34 – 8,98 ln V
NOx (g/km) = 37,21 – 6,46 ln V
Particulados (g/km) = 1,74 – 0,32 ln V
Onde V = Velocidade (km/h)
Os valores monetários para os poluentes
A monetarização do quilo de cada poluente partiu de valores definidos no estudo da ANTP/Ipea em 1998. Utilizou-se para sua atualização o IPCA do IBGE acumulado até julho de 2012.
HC = R$ 2,74 / kg
CO = R$ 0,46 / kg
NOx = R$ 2,69 / kg
Partículas = R$ 2,19 / kg
Para a obtenção dos valores totais dos gastos em cada ano foram utilizados dados de frota para os automóveis e ônibus constantes da tabela 9.
Custo do transporte de carga
Para a apuração do custo do transporte de carga foram utilizadas funções desenvolvidas pela NTC & Logística (Associação Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas e Logística). Considerou-se o aumento do custo da tonelada em um percurso médio entre 31 km e 40 km em função de uma queda na velocidade de 50 km/h para a velocidade média estimada para cada ano, conforme definida na tabela 7. Os demais parâmetros e desembolsos fixos e variáveis da composição do custo de transporte permaneceram os mesmos.
As funções utilizadas para a estimativa do custo do transporte de cargas são as seguintes:
Custo-peso = [A + (B * X)],
Onde:
A = custo de carregar e descarregar
B = custo de transferência
X = distância
A e B derivam das funções:
A= [(CF / H) Tcd / CAP B={[CF / (H V)] + CV}/ CAP
Onde:
V = velocidade média
Custo fixo (CF) = R$ 10.648,68
Horas trabalhadas (H) = 248,60 horas
Tempo de carga/descarga (Tcd) = 2,5 horas
Capacidade de carga do veículo (CAP) = 2,25
Custo variável por km (CV) = R$ 0,6849
Para o cálculo do custo envolvendo o transporte de cargas foi preciso estimar o volume de carga transportada na cidade de São Paulo. O ponto de partida foram os dados da carga transportada no País, cujo levantamento foi realizado até o mês de julho de 2011 pela Fipe através do indicador Idet (Índíce de Desempenho Econômico do Transporte), calculado em parceria com a CNT (Confederação Nacional dos
Transportes). Do total para o Brasil foi estimado o equivalente para a cidade de São
Paulo tendo como referência o PIB da cidade no PIB nacional. Para o ano de 2011 e 2012 foi estimado um crescimento médio de 1,5% no volume transportado. Esse índice foi obtido por conta da média de crescimento entre 2006 e 2010 observado no levantamento da Fipe. A tonelagem de carga estimada para cada ano está descrita na tabela A-13 do anexo.
A velocidade para o custo da carga utilizada nas funções da NTC & Logística foram as médias da tabela 7 para cada ano e o resultado comparado com uma velocidade sem congestionamento, de 50 km/h.
As tabelas a seguir, da 10 até a 15, resumem os custos pecuniários para os anos considerados. Elas foram extraídas das tabelas A9 até A13, todas do anexo. Na coluna resultado o valor se refere a diferença entre uma situação com congestionamento, considerando a velocidade referente a cada ano, e sem congestionamento, com base em uma velocidade de 50 km para automóveis e 30 km para ônibus. Essa diferença é multiplicado pela frota de cada tipo de veículo e no transporte de carga ao volume transportado.
Em 2002, tal como consta na tabela 10, os gastos de combustível pelos automóveis representaram mais de R$ 3,4 bilhões e no caso dos ônibus superaram R$ 184 milhões. Em relação à poluição o desembolso é de mais de R$ 479 milhões para os carros e de mais de R$ 17 milhões para os ônibus. Quanto às perdas com o transporte de mercadorias elas ultrapassaram R$ 2,8 bilhões no ano. No total o custo pecuniário da lentidão em 2002 foi de quase R$ 7 bilhões.
A tabela 11 mostra que em 2004 os desembolsos adicionais com combustível pelos automóveis foram de mais de R$ 3,7 bilhões e para os ônibus ultrapassaram R$ 242 milhões. Em relação à poluição o desembolso superou R$ 525 milhões para os carros e R$ 23 milhões para os ônibus. Quanto às perdas com o transporte de mercadorias elas ultrapassaram R$ 2,7 bilhões no ano. No total o custo pecuniário da lentidão em 2004 foi superior a R$ 7,3 bilhões.
A tabela 12 apresenta o resultado de 2006. Naquele ano os desembolsos adicionais com combustível pelos automóveis foram de quase R$ 3,8 bilhões e para os ônibus superaram R$ 288 milhões. Quanto à poluição o custo superou R$ 528 milhões para os carros e R$ 28 milhões para os ônibus. Quanto às perdas com o transporte de mercadorias elas foram de quase R$ 3,7 bilhões no ano. No total o custo pecuniário por conta do trânsito congestionado foi superior a R$ 8,3 bilhões.
Em 2008, como apresentado na tabela 13, os gastos adicionais com combustível pelos automóveis foram superiores a R$ 4,7 bilhões e para os ônibus superaram R$ 268 milhões. Quanto à poluição o custo superou R$ 659 milhões para os carros e R$ 25
milhões para os ônibus. Em relação às perdas com o transporte de mercadorias elas superaram R$ 4,4 bilhões no ano. No total o custo pecuniário em 2008 foi superior a R$ 10 bilhões.
Em 2010 a tabela 14 mostra que os custos adicionais com combustível pelos automóveis ficaram acima de R$ 4,2 bilhões e para os ônibus superaram R$ 256 milhões. Já a poluição superou R$ 596 milhões para os carros e foi de mais de R$ 24
milhões para os ônibus. Em relação ao transporte de mercadorias o custo foi superior a R$ 3,6 bilhões no ano. No total, em 2010 as perdas somaram mais de R$ 8,8 bilhões.
Para 2012 a tabela 15 revela que os custos com combustível pelos automóveis são da ordem de R$ 4,8 bilhões e para os ônibus superam R$ 318 milhões. O custo com poluição está acima de R$ 677 milhões para os carros e mais de R$ 29 milhões para os ônibus. Em relação ao transporte de mercadorias o custo é estimado acima de R$ 4 bilhões no ano. No total, em 2012 as perdas somam quase R$ 10 bilhões.
Resultados
Os resultados apresentados na tabela 16 e no gráfico 2 revelam que os custos estimados por conta dos congestionamentos são crescentes ao longo do tempo. No caso dos custos pecuniários os desembolsos passaram de R$ 7 bilhões em 2002 para R$ 10 bilhões em 2012. Já os custos de oportunidade saltaram de R$ 10,3 bilhões para R$ 30,2 bilhões no mesmo período. No total, as perdas saíram de R$ 17,3 bilhões em 2002 para R$ 40,1 bilhões em 2012.
O pecado original do modelo viário
São Paulo é vitima de uma concepção urbanística ultrapassada. Segue o modelo de uma cidade formada por um núcleo central rodeado por centros periféricos residenciais e comerciais de segunda ordem. O sistema viário segue essa lógica, com a construção de grandes artérias radiais para onde flui o trânsito, na expectativa de os veículos circularem em velocidades mais elevadas em direção a esses pontos centrais.
Se o leitor sobrevoar a cidade em um helicóptero, verificará que os congestionamentos se concentram nas grandes vias arteriais e em seus acessos, ao passo que o restante do leito carroçável fica quase sem fluxo de veículos, mesmo nos horários de pico. A perversa lógica viária arrasta os motoristas para essas artérias por meio de complexo sistema de mão e contramão, bloqueios de vias e redes de semáforos que privilegiam as grandes correntes de tráfego.
Essa concepção viária induz à execução dos megaprojetos de vias arteriais como os de gigantescos túneis, avenidas, viadutos e pontes que, no entanto têm se revelado inúteis, pois apenas deslocam os congestionamentos para alguns metros adiante.
Vale uma comparação de São Paulo com a ilha de Manhattan, em Nova York. Na capital paulista, são 1.500 km², por onde circulam quase sete milhões de veículos, ou seja, pouco mais de 4,6 mil veículos por km². Em Manhattan, com área de 87,5 km², circulam cerca de 2 milhões de veículos, ou quase 23 mil carros por km². Mesmo tendo 5 vezes a densidade de veículos de São Paulo, os congestionamentos lá são bem menos intensos. Os veículos ocupam de maneira mais ou menos homogênea todas as vias da ilha, fazendo o trânsito fluir por toda a superfície com mais velocidade.
O sistema arterial concentrador não funciona mais. Ele demanda investimentos pesados em infraestrutura viária. Construir grandes obras como tem sido a tônica das ações viárias nos últimos anos servem apenas para transferir os congestionamentos de um lugar para outro. Os túneis Ayrton Sena, Jânio Quadros, Faria Lima e Rebouças e a ponte estaiada do complexo Real Parque custaram quase R$ 3 bilhões, mas não geraram benefícios significativos para a circulação de pessoas e de cargas. Caso esses recursos tivessem sido aplicados, por exemplo, na construção de 80 pontes sobre os rios Pinheiros e Tiête e/ou na interligação de vias lindeiras às marginais, a cidade teria hoje um sistema revascularizado que minimizaria os quilométricos congestionamentos.
O objetivo deve ser revascularizar o trânsito. Em vez de grandes obras, bastaria um conjunto de obras de porte menor por todos os pontos críticos da cidade de forma a criar um sistema integrado de circulação paralela às grandes artérias. A médio prazo se estaria criando uma malha de vias reticulares por toda a cidade, desconcentrando fluxos de veículos, retirando-os das artérias entupidas e aproveitando melhor cada metro quadrado dos mais de 16 mil quilômetros de vias existentes em São Paulo e que hoje ficam ociosas, exceto para o trânsito local.
Transportes coletivos, com ênfase em investimentos em metrô, são constantemente lembrados como a solução futura. Porém, isso exige um grande volume de recursos e não dá para esperar até que eles surjam e o problema comece a ser equacionado. O custo internacional do quilômetro do metrô é estimado entre R$ 90 milhões e R$ 180 milhões.
Essa posição passiva significa que não haverá solução para o trânsito paulistano até o país se tornar rico, e ter recursos para resolver o problema, ou atrair investimentos externos. Mas isso certamente não ocorrerá com as condições de circulação na cidade, uma vez que elas geram deseconomias externas e restringem a capacidade de crescimento da renda, do emprego e dos recursos para investimento.
Contudo, é possível empreender ações paliativas que reduzam os congestionamentos até que os investimentos em transporte coletivos sejam aumentados e equacionem o problema. É imprescindível que se estabeleça um mix de ações de curto, médio e longo prazos que alivie gradativamente o custo imposto pelos congestionamentos à sociedade.
Algumas as ações importantes seriam:
Redirecionar recursos que hoje são canalizados para grandes obras para revascularização do sistema viário;
Agir com rigor na fiscalização de veículos velhos e inseguros. Nas ruas, circulam até carrinhos de mão e carroças com tração animal;
Restrição à circulação de caminhões de grande porte. São Paulo precisa funcionar 24 horas por dia, e horário para transporte de carga deve ser entre 22h e 6h;
Investir em terminais de transbordo. Isso evitaria os comboios de ônibus vazios em fila indiana na região central e grandes avenidas;
Implantar pedágio urbano, como em Londres, Milão, Estocolmo, Cingapura e Oslo. Isso seria importante para igualar a utilidade marginal privada ao custo social pelo uso do automóvel;
Utilização de combustíveis não poluentes em toda a frota de ônibus em um prazo entre 5 e 10 anos;
Utilizar o IPVA para desestimular a utilização de carros mais antigos, que gastam mais combustíveis e poluem mais. O tributo seria mais caro para automóveis com mais de 10 anos de uso e mais barato para carros novos;
Estabelecer parcerias entre os governos federal, estadual e a iniciativa privada para acelerar a expansão da malha metroviária;
Investimento na utilização dos 257 km de ferrovias da CPTM para implantação de metrôs de superfície.
Tributar o uso do veículo e não o preço.
Conclusão
O desgaste dos veículos causados pelos congestionamentos, a poluição que geram e o aumento do consumo de combustíveis já são aspectos negativos de peso em qualquer análise econômica. Contudo isso seria minimizado quando comparado ao valor econômico das horas de trabalho desperdiçadas e à perda de qualidade de vida das pessoas, causada pelo esgotamento físico e danos psicológicos do trânsito parado.
O “custo São Paulo” pressiona dramaticamente o “custo Brasil”. O total de perdas estimado para 2012 é da ordem de R$ 40 bilhões. São R$ 30 bilhões que se deixa de produzir somados aos R$ 10 bilhões provenientes das deseconomias externas do excessivo número de veículos em circulação, refletidas no aumento do consumo de combustíveis, na maior emissão de poluentes e na elevação do custo do transporte de cargas.
Os congestionamentos em São Paulo não são um mero problema local, mas um gargalo nacional. A lentidão crescente dos deslocamentos implica custos bilionários. E mais grave ainda, a tendência é que continuem aumentando, pois a frota prossegue em firme expansão.