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Marcos Cintra

Movimentação Financeira: A Base Tributária Emergente


O SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO E A ERA DIGITAL

O Brasil possui um dos sistemas tributários mais complexos e dispendiosos do mundo. São vários impostos incidentes sobre bens e serviços, patrimônio, operações financeiras, comércio exterior e renda das empresas e das pessoas físicas. Além disso, há uma grande quantidade de taxas e contribuições cobradas sobre os salários e o faturamento das empresas.

Toda essa parafernália de tributos – mais de noventa no total – extrai atualmente um montante anual equivalente a um terço do produto interno bruto (PIB) nacional. Historicamente, a arrecadação tributária no período entre os anos 1970 e meados da década de 1990 representou em média pouco mais de 25% do PIB, e a partir de então, a arrecadação de recursos pelo setor público passou a absorver fatias crescentes do produto nacional. A expansão da arrecadação tributária no Brasil a partir da segunda metade dos anos 1990 teve como principal motivo a estabilização da moeda, o que eliminou o imposto inflacionário. O desajuste orçamentário gerado naquele período foi corrigido visando à recuperação da capacidade de investimento do poder público. A partir da década de 2000, um novo desarranjo nas contas governamentais ocorreu por conta da implementação acelerada de vários programas sociais que tinham a intenção de criar um Estado de bem-estar social no país, como inscrito na Constituição Federal de 1988 (CF/1988). Essas ocorrências, ao promoverem expressivos desequilíbrios nas contas públicas, causaram uma forte elevação da carga de impostos e contribuições para o brasileiro.

Os desequilíbrios orçamentários dos anos 1990 e 2000 demandaram transferências crescentes de recursos do setor produtivo para o setor público. Isto se deu por meio de novos impostos e contribuições, majoração de alíquotas e alteração da base de cálculo de vários tributos. Estas medidas foram implementadas ao longo dos anos por meio de uma miríade de leis, portarias e decretos, que deram origem a uma estrutura tributária extremamente burocrática, complexa e desestruturada, classificada como uma das piores e mais disfuncionais do mundo, conforme apura todo ano o Fórum Econômico Mundial.

O sistema tributário brasileiro convive há anos com uma proliferação insana de regras voltadas tanto à elevação da arrecadação pública como ao atendimento da necessidade de fiscalização e controle nos três níveis de governo. Segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), entre outubro de 1988, quando foi promulgada a CF, e setembro de 2016 foram editadas quase 364 mil normas tributárias, o equivalente a 45 por dia útil. Essa prática criou um cenário complexo que estimula e facilita a sonegação, gera expressivo custo administrativo para a atividade produtiva e torna o sistema imprevisível em seus efeitos e impactos econômicos.

Nas últimas duas décadas, o Brasil ensaiou várias vezes, sem sucesso, reformar sua estrutura tributária. Surgiram proposições inovadoras, como a que unifica vários tributos sobre a movimentação financeira, por exemplo o Imposto sobre Movimentação Financeira (IMF), mas a regra tem sido a insistência em propostas convencionais que propõem consolidar alguns tributos na forma de impostos sobre o valor agregado, como o Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Porém, ao longo de anos de debate, o país ainda não foi capaz de empreender ações amplas e profundas capazes de implantar uma estrutura simplificada de impostos e contribuições que combata a evasão de receita, reduza custos administrativos para o poder público e para as empresas e acabe com a forte iniquidade na distribuição do ônus tributário entre os contribuintes.

1.1 Evasão e sonegação Desde meados dos anos 1990, o Brasil vem postergando a reforma tributária e, com isso, a complexa estrutura fiscal vai se tornando cada vez mais inconsistente. Os fiscos, nos três níveis de governo, com frequência criam normas para tentar evitar a fuga de receita, mas, em consequência, o sistema fica cada vez mais burocratizado e impõe custos administrativos crescentes para a produção nacional. Nesse ambiente, o sonegador se beneficia e a evasão se torna um prêmio.

O SINPROFAZ (2015) divulgou uma estimativa mostrando que R$ 443,9 bilhões deixaram de entrar nos cofres públicos em 2014 por conta da sonegação. O valor foi equivalente a 8,6% do PIB brasileiro e a 23,6% da arrecadação total de R$ 1,9 trilhão naquele ano. De acordo com a entidade, os tributos mais sonegados foram: i) Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), com R$ 110 bilhões; ii) contribuições previdenciárias, representando R$ 104 bilhões; iii) Imposto de Renda (IR), com R$ 85 bilhões a menos; iv) Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), configurando R$ 43 bilhões; e v) Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), com R$ 29 bilhões.


A presença de forte evasão tributária gera dois efeitos estruturais importantes: a tributação compensatória adicional sobre outros contribuintes para compensar as perdas de arrecadação e a anomalia sobre a concorrência empresarial. No primeiro caso, para cobrir o que os sonegadores deixam de recolher, o governo passa a onerar com maior intensidade algumas bases de mais fácil exação, como salários e consumo. Essa sobretaxação cria a expressiva iniquidade na distribuição do ônus fiscal observada no Brasil, que em geral sobrecarrega a classe média assalariada.


Tributos com forte incidência sobre o consumo – como ICMS, Programa de Integração Social (PIS), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Cofins, Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), entre outros – representam cerca de 47% da arrecadação total do poder público. Por sua vez, os impostos aplicados sobre os salários, como o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) e as contribuições previdenciárias, assim como a tributação sobre a folha de pagamentos das empresas, equivalem a cerca de 34% da receita global. Ou seja, o rendimento dos trabalhadores e o consumo contribuem com mais de 80% de tudo que o poder público arrecada no Brasil e limitam fortemente a expansão do poder aquisitivo do consumidor.


Em relação à dinâmica empresarial, a sonegação, a evasão e a elisão tornam-se fortes instrumentos de concorrência desleal, distorcendo a eficiência alocativa de recursos e reduzindo a produtividade da economia, pois isso deteriora severamente o ambiente de negócios no país. Em outras palavras, as empresas em busca de maior competividade recorrem à sonegação como um artifício de sobrevivência.


1.2 Complexidade e altos custos de conformidade

Outro expressivo problema relacionado ao sistema tributário brasileiro encontra-se no custo que a complexidade tributária impõe ao setor produtivo nacional. Muito se fala da baixa competitividade da produção nacional, mas pouco se discute o alto custo das obrigações tributárias acessórias suportadas pelas empresas brasileiras.


PWC e The World Bank (2017) revelam que uma firma brasileira gasta 1958 horas por ano para resolver questões tributárias, e o segundo colocado desse ranking é a Bolívia, com 1025 horas. Na sequência aparecem Líbia (889 horas), Venezuela (792 horas) e Equador (666 horas). Entre as economias emergentes, cabe citar a China (207 horas) e a África do Sul (210 horas). Entre os países ricos, a Alemanha exige 218 horas, e os Estados Unidos, 175. Competir em um ambiente burocrático como o existente no Brasil representa um desafio insuperável para as empresas, pois tempo e dinheiro que poderiam ser gastos na produção são canalizados para atender às imposições do fisco.


Bertolucci (2001) supriu uma lacuna no meio acadêmico, abordando uma área que ainda hoje é pouco pesquisada: os custos relacionados com a burocracia tributária. Mesmo que tenha sido elaborado há tempos, o estudo permite avaliar o impacto sobre a gestão empresarial da complexa estrutura tributária brasileira, e há razões de sobra para acreditar que a situação identificada tenha se agravado desde então. O autor menciona que o custo de conformidade chega a 0,75% do PIB, ou seja, cerca de R$ 50 bilhões por ano, tomando por base pesquisas feitas junto à média das empresas abertas brasileiras. Esse custo pode atingir o equivalente a 5,82% do PIB, quando se consideram as companhias abertas com receita bruta anual de até R$ 100 milhões, classe que incluía à época a ampla maioria das empresas brasileiras.


1.3 Propostas convencionais e carência de inovação tributária


Há uma inquietante falta de sintonia entre a realidade do mundo moderno, regido pela tecnologia digital, e o ambiente tributário encontrado no Brasil e no resto do mundo. A atual era da informática permeia todas as atividades humanas, facilitando o dia a dia das pessoas, gerando eficiência no processo produtivo das empresas e permitindo algum grau de transparência e simplificação em segmentos da gestão pública, porém os sistemas tributários em uso permanecem impermeáveis a tudo isso. Hoje, praticamente tudo ocorre por meio de fluxos de bits e bytes, mas em relação aos impostos, a prática e o pensamento de muitos tributaristas e economistas ainda têm a ver com o que está em livros escritos em meados do século passado.


A inquietação se dá no momento em que o Brasil volta a debater uma reforma tributária e a proposta dominante é a criação de um IVA nacional, um tributo convencional que vem sendo crescentemente desafiado pela globalização, pela era digital e pela desmaterialização das bases tributárias ortodoxas. Há que se criar um novo paradigma tributário, capaz de se ajustar a um mundo dinâmico e desafiador, no qual os conceitos tradicionais da ciência tributária rapidamente perdem aderência com a realidade da economia moderna.


As bases tributárias convencionais, estruturadas sobre conceitos declaratórios, aplicam em sua grande maioria os métodos conhecidos como autolançamento e autorrecolhimento com auditoria, uma tecnologia complexa, artesanal e profundamente contraditória em relação às tendências globalizantes e informatizadas das transações econômicas realizadas no mundo moderno. Estes métodos exigem de cada pagador de impostos a autoapuração e o oferecimento de seus rendimentos à tributação e sua posterior submissão a auditorias amostrais para aferir a veracidade das informações. Nesse sistema, a fiscalização exige o acompanhamento físico das transações econômicas, uma tarefa cada dia mais difícil e onerosa de ser realizada com sucesso em um mundo em que a geração de valor frequentemente ocorre mediante a transmissão de impulsos eletrônicos com difícil, se não impossível, identificação de origem e destino. As transações eletrônicas, o comércio pela internet, a volatilidade e mobilidade de fatores, capitais, mercadorias e serviços tornam a tarefa quase impraticável por haver necessidade de fiscalizar e auditar um número incalculável de transações que se realizam a cada momento. O resultado é a crescente necessidade de novos investimentos em tecnologia de informação por parte do poder público para apurar se as práticas do contribuinte são corretas. Muitas vezes, a privacidade pessoal e o sigilo econômico tornam-se vítimas dessa assustadora realidade que toma conta do dia a dia dos agentes econômicos. Agravando ainda mais o quadro, criam-se áreas cinzentas e indivisíveis entre a auditoria tributária e a atividade policial repressiva, tornando o contribuinte um suspeito em potencial, até prova em contrário.


Os livros de finanças públicas da década de 1950 ainda regem profissionais que não se ajustaram ao mundo digital. Muitos até agora são reféns de conceitos ultrapassados, que não se adequam ao ambiente vigente. Frente a esta realidade, surge a alternativa da base tributária digital por excelência, que é a transação financeira realizada pelos sistemas bancários nacionais. A cobrança de tributos passa a ser automatizada, incidindo diretamente sobre a moeda eletrônica que circula nos bancos, dispensando regras, papéis e controles que impõem custos elevadíssimos para os governos e as empresas. Um imposto aplicado sobre a movimentação nas contas bancárias, em substituição aos tributos atuais, é a forma mais barata e eficiente de obter recursos públicos, pois trata-se de uma inovação tributária que atende ao cenário atual da economia virtual e globalizada.


É preciso pensar a reforma tributária com base no ambiente digital contemporâneo. Não há como imaginar que os tributos convencionais gerados na era do papel, dos livros contábeis e das barreiras físicas de transporte serão capazes de evitar a generalizada evasão tributária e suas dramáticas consequências para o financiamento do Estado moderno.


1.4 A era digital


A tecnologia digital coloca a sociedade global em um patamar de evolução que há vinte ou trinta anos podia ser considerado um cenário de ficção. Nesse ambiente em que automóveis são projetados dispensando motorista e robôs realizam cirurgias em seres humanos com enorme precisão, as pessoas usufruem de maior comodidade em suas atividades rotineiras, vivem mais e otimizam seu tempo com entretenimento. As empresas, por sua vez, podem desenvolver novos modelos de negócios, customizar produtos e serem mais eficientes e lucrativas. No âmbito público, ela torna possível um nível de governança menos burocrático, que agiliza processos e permite uma gestão mais transparente.


O ambiente digital é uma realidade que faz com que inovações ocorram de modo cada vez mais rápido. Os fluxos de bits e bytes transportando dados, que antes impactavam fundamentalmente elementos intangíveis, hoje também afetam os tangíveis de modo extraordinário. Aspectos concretos da atividade de produção são cada vez mais determinados pela era digital. Como bem definiu o economista e professor da Fundação Getulio Vargas, Fernando Rezende (2017), trata-se de um mundo novo, marcado pela virtualização das transações e caracterizado pela substituição das máquinas e outros ativos físicos pela capacidade intelectual; por amplas redes unindo fornecedores, clientes e até competidores; e que torna irrelevante a localização das plantas empresariais.


A informática e o ambiente digital em que a atividade produtiva está contida seguem impactando todos os meandros da sociedade, com exceção da ciência tributária. Os sistemas de impostos e contribuições, de um modo geral, destoam de um mundo que evolui com base na inteligência artificial e na troca de informações fundamentada em impulsos elétricos.


Muitos acadêmicos, tributaristas, economistas e outros agentes que lidam com a área fiscal seguem tratando as estruturas tributárias como uma máquina de escrever ou de calcular mais rápida. A tecnologia digital não penetrou nesse meio, isto é, não influenciou conceitos e bases do sistema de impostos; com isso, a principal forma de cobrança dos fiscos se dá em moldes convencionais, ou seja, continua sendo a movimentação de mercadorias, e as ferramentas e os princípios utilizados ainda são os mesmos ditados pelos livros escolares de mais de meio século atrás.


Não há sintonia entre exigências de notas fiscais e barreiras alfandegárias que ainda vigoram nos sistemas tributários mundiais e a era eletrônica que está produzindo a quarta revolução industrial, a da indústria 4.0 e dos voos interplanetários ou da engenharia genética. Há uma impermeabilidade ímpar entre as práticas tributárias ao redor do mundo e as novas descobertas científicas.


Este é um tema pouco explorado, cuja omissão, quando se debate reforma tributária, terá como efeito o aprofundamento de anomalias causadoras de ineficiências no aparato de gestão pública e na equidade da estrutura fiscal. Em um mundo comandado por impulsos elétricos, a cobrança de tributos deve ser automatizada, incidindo diretamente sobre a moeda eletrônica em trânsito nas contas-correntes de livre movimentação nos bancos. Desta forma, as normas burocráticas seriam dispensadas, reduzindo expressivamente os elevados custos administrativos para as empresas e o governo. Esta é a forma de tributação que se ajusta ao ambiente digital e é capaz de corrigir distorções como a predominância de informações assimétricas no sistema econômico e a sonegação.


Os modelos teóricos que serviram de base para os convencionais partem de premissas não observáveis no mundo real. Seus princípios são meramente heurísticos e, por isso, criam sistemas que só existem no plano das ideias. A tributação sobre a movimentação financeira é capaz de incorporar as imperfeições que impactam nos sistemas tributários, criando uma estrutura ótima superior à tradicional.


As bases tributárias clássicas – como a renda pessoal, o lucro das empresas, o consumo e o patrimônio – deixaram de ser eficazes para a extração de recursos públicos. Todas elas adquiriram particularidades distintas frente ao novo cenário mundial, caracterizado pela integração econômica, a desmaterialização da produção e o avanço dos meios de fabricação eletrônicos.


As pessoas físicas com altos rendimentos passaram a ter uma mobilidade física que jamais tiveram. Artistas, esportistas, executivos e grandes empresários escolhem seus domicílios fiscais e investem seus rendimentos em países onde a tributação é menor. Assim, tornam-se alvos voláteis e incertos para os fiscos de seus respectivos países.


No caso dos lucros das empresas, a mobilidade é ainda mais acentuada. As grandes multinacionais utilizam preços de transferências em suas relações internas, e a escolha na localização de suas bases de operação passou a ser um instrumento de minimização de suas obrigações tributárias.


A facilidade no transporte de pessoas por todo o mundo e o turismo de lazer e de negócios afetam a tributação do consumo, pois comerciantes e turistas podem adquirir produtos de elevado valor agregado em países que oferecem preços mais reduzidos. A expansão acelerada do comércio pela internet também dificulta a tributação convencional, obscurecendo a identificação dos locais de origem e destino da operação. Nesse contexto de profundas mudanças, a eficácia dos sistemas tributários atuais está sendo desafiada. Em realidade, o paradigma convencional está morrendo.


2 REFORMA TRIBUTÁRIA: PROPOSTAS ORTODOXAS, SEUS PROBLEMAS E O CONFRONTO COM O IMF


Desde a década de 1990, o Brasil vem debatendo uma reforma tributária. A corrente de pensamento convencional, baseada em princípios de finanças públicas idealizados cinquenta anos atrás, tem defendido projetos de unificação de impostos e contribuições sobre uma base ortodoxa e burocrática que não se ajusta ao mundo moderno: a tributação sobre o valor agregado, o IVA.


O contraponto a essa visão tem sido uma vertente inovadora que defende a adoção de um imposto único sobre a movimentação financeira – o IMF – como alternativa à burocracia, à iniquidade do ônus fiscal no país e à forma ideal de exação no mundo digital. Os adeptos do IVA dizem que ele é eficaz para enfrentar a burocracia do atual sistema tributário do país e que o foco de uma reforma tributária deve ser eliminar a cumulatividade, característica desse sistema.


É evidente que juntar vários tributos em um grande IVA nacional simplifica o sistema tributário. Contudo, importantes e indispensáveis aspectos são requentemente negligenciados. Há questões fundamentais a serem debatidas, em conclusão das quais é possível afirmar que o IMF é preferível ao IVA, conforme resumido adiante.


• O IVA distorce mais os preços do que os tributos cumulativos. Simulações efetuadas, cuja metodologia encontra-se em Cintra (2009), revelam que um IVA que agrega PIS, Cofins, ICMS, IPI e Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sobre a folha de salários gera um ônus médio de 32,3% sobre os preços de 128 setores analisados. Todavia, um IMF com alíquota de 1,18% no débito e no crédito de cada lançamento nas contas-correntes de livre movimentação nos bancos, suficiente para substituir esses cinco tributos, impacta em média 5,91%. Relativamente a uma situação de imposto zero, isto é, livre de qualquer distorção alocativa causada pela estrutura tributária, simulações matemáticas revelam que a inserção de um IVA causa um desvio nos preços relativos desses setores de 9,60%, enquanto a inserção do IMF causa desvio de 1,32%. Conclui-se, portanto, que a busca por um modelo tributário que minimiza as distorções na alocação de recursos produtivos favorece a tese do IMF.


• O IVA é complexo, de alto custo e difícil assimilação pelos contribuintes. Além disso, é um tributo declaratório e exige sistemas de controle que impõem custos elevados para a fiscalização do governo e para o contribuinte. Parte da receita pública obtida é canalizada para financiar a burocracia fiscal e as empresas arcam com elevadas despesas administrativas para cumprir as exigências da lei, portanto, o custo administrativo se manteria elevado no Brasil. O IMF, por sua vez, é um tributo não declaratório e de fácil cobrança, ou seja, não requer a enorme gama de declarações e guias exigidas dos tributos declaratórios. Seu custo é baixo para o contribuinte e o governo, gerando um contencioso praticamente nulo, a exemplo da aplicação por doze anos do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF)/Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) no Brasil.


• Por incidir sobre uma base restrita, o valor agregado, o IVA requer uma alíquota elevada. Essa situação, combinada com o fato de se tratar de um tributo declaratório, estimula a evasão e a sonegação. O IMF, por seu turno, é um tributo universal. Sua base ampla permite usar uma alíquota reduzida para obter a mesma receita que um IVA com alíquota elevada, e sua cobrança automática, associada com essa alíquota baixa, traduz-se em uma forma eficaz de combate à evasão de arrecadação.


• O IVA é um tributo próprio de países unitários, e devido a isso, não funciona em países federativos como o Brasil. Poucas nações organizadas sob essa forma adotam esse tipo de imposto. Aplicá-lo em uma estrutura federativa gera custos administrativos elevados e muita complexidade, situação que dá margem a fraudes. A Europa, depois da unificação, passou a conviver com casos frequentes de irregularidades neste imposto, cujos valores foram estimados em € 152 bilhões pela Comissão Europeia em 2015.


Portanto, um IMF, mesmo cumulativo, revela-se superior comparativamente a uma proposta ortodoxa como o IVA.


2.1 Um sopro de modernidade: o IMF


O ideal da unicidade tributária, ou seja, de um imposto único, é antigo. Surgiu com os fisiocratas, no século XVIII, que defendiam a tributação sobre a terra como única fonte de recursos para financiar o poder público. A partir de então, vários pensadores se dedicaram à busca de uma base ampla o suficiente que permitisse implantar esse tipo de tributação, universal e com alíquota reduzida para ser suportável. Porém, essa meta não logrou êxito ao longo de décadas.


A transação financeira concentrada nos bancos representa a base de incidência tributária que muitos economistas e tributaristas buscavam para criar um imposto universal. Ela surgiu com a recente supremacia da moeda escritural sobre a manual e com a intensa informatização das operações bancárias.


A convergência entre a busca da unicidade tributária e a solidificação de um sistema baseado na moeda escritural eletrônica deu origem à proposta do Imposto Único no Brasil, que introduziu a movimentação financeira como uma nova e eficiente forma de obter recursos públicos. Trata-se de um modo de tributação que irá se impor em um cenário mundial em que a economia se assenta cada vez mais sobre bases digitais.


A principal razão do surgimento da movimentação financeira no Brasil como base de unificação de tributos advém de causas históricas. Ainda que o Imposto Único tenha uma longa e respeitável tradição na evolução do pensamento econômico, ele nunca pôde se materializar, pois em nenhuma circunstância uma sociedade reuniu as duas condições básicas para a efetiva operacionalização do conceito de transação como base tributária. A primeira é a existência de um sistema bancário altamente informatizado, com um sistema nacional em tempo real de compensação de documentos e de registro de operações. A segunda é a predisposição cultural da sociedade de não usar moeda manual, substituindo-a pelas mais variadas formas de moeda escritural.


O Brasil preenche plenamente esses dois quesitos, pois possui um dos sistemas bancários mais desenvolvidos e informatizados em todo o mundo, com padrões tecnológicos superiores aos encontrados em economias desenvolvidas, como os Estados Unidos e a Europa. Em realidade, o país é referência mundial em tecnologia bancária. Além disso, a economia brasileira é uma das mais desmonetizadas do mundo e, culturalmente, já absorveu a inevitável substituição da moeda manual pela escritural, e principalmente pela eletrônica.

No início dos anos 1990, quando se discutia a criação de um IMF com o propósito de contribuir para o ajuste das contas públicas (o IPMF que vigorou em 1994), e depois para financiar a saúde pública (a CPMF, que vigorou de 1997 a 2007), muitos críticos desse tipo de tributo alardearam que ele seria danoso ao sistema produtivo nacional. No entanto, os fatos acabaram desmentindo as profecias catastróficas apregoadas na época, pois a experiência brasileira com a tributação sobre movimentação financeira foi positiva. Mostrou ser de baixo custo para os contribuintes e o governo, além de ser imune à sonegação e à evasão.


Infelizmente, a implantação do IMF foi desvirtuada no Brasil, pois surgiu como mais um tributo, quando a ideia inicial era ser um substituto dos atuais impostos e contribuições. Ele tinha o conceito de ser um único imposto eletrônico, instituído no lugar de todos os outros, que hoje representam cerca de 80% da carga tributária do país.


Por razões que não cabe discutir aqui, o debate que levou à sua extinção em 2008 foi fundamentalmente político, ignorando-se por completo a experiência que, de forma pioneira em todo o mundo, foi implantada no Brasil com enorme sucesso em doze anos de vigência.

O fato inegável é que a experiência da CPMF foi definitivamente um capítulo inicial de uma ampla revisão de conceitos na área tributária brasileira. Como afirmou Tanzi (2000), especialista em finanças públicas, a movimentação financeira é a única inovação tributária ocorrida após a introdução dos tributos sobre valor agregado em meados do século passado.


2.2 O que é e como funciona o IMF


O IMF, por sua universalidade de incidência e facilidade de arrecadação, possibilita a substituição de impostos e contribuições de natureza declaratória por uma aplicação sobre transações bancárias. Pode ser utilizado tanto como um substituto pontual de tributos de baixa produtividade e alto custo quanto, em sua forma mais radical, como um imposto único. Os tributos declaratórios convencionais seriam extintos e a receita que eles geravam seria obtida mediante a criação de um único imposto, incidente sobre as transações bancárias realizadas nas contas movimento dos clientes.


A adoção do IMF será acompanhada de um tratamento diferenciado em relação à transação envolvendo moeda em espécie e aos mercados financeiros. Quanto ao segundo caso, haverá uma conta investimento na qual o dinheiro irá circular sem a incidência desse tributo, sendo cobrado o IR sobre os ganhos das aplicações. Apenas quando esse dinheiro retornar para operações na conta movimento, o IMF voltaria a incidir. Quanto ao primeiro caso, o projeto prevê a cobrança de uma alíquota adicional sobre os saques e depósitos para compensar o período que, em média, o papel-moeda ficará em circulação até seu retorno para o sistema bancário. Ademais, cabe esclarecer que a aplicação do IMF exigiria proteção legal, no sentido de tornar obrigatória a circulação pelo sistema bancário de qualquer operação comercial para que ela tenha validade e legitimidade. O projeto do Imposto Único prevê a extinção dos tributos relacionados a seguir. 1) Federais:

a) IRPF;

b) Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ): lucro real e presumido;

c) Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL): lucro real e presumido;

d) INSS sobre folha de pagamentos, produção rural, faturamento e outros;

e) Salário-Educação;

f) Sistema S;

g) IPI;

h) Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide);

i) Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros (IOF);

j) Cofins (cumulativa e não cumulativa);

k) Simples; e

l) Outros impostos e contribuições.

3) Estaduais:

a) ICMS;

b) Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA); e

c) Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

4) Municipais:

a) ISS;

b) Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU); e

c) Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).


Da atual carga tributária brasileira, que corresponde a 33% do PIB, os tributos substituídos pelo IMF representam cerca de 26%. Sendo assim, permaneceriam existindo impostos necessários para a execução da política industrial, como: i) os incidentes sobre comércio exterior; ii) as contribuições previdenciárias individuais dos servidores públicos e para o INSS; iii) as taxas; iv) os tributos que se configuram como poupança do trabalhador, como é o caso do FGTS; v) o Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT); e vi) o IR sobre o mercado financeiro. Esses tributos equivalem a 7% do PIB.


O IMF prevê a substituição de tributos que representam 80% da carga tributária brasileira. Essa unificação, ao ocorrer sobre uma base ampla e universal como a movimentação financeira na conta movimento nos bancos, exigirá uma alíquota de 2,8% sobre o débito e crédito de cada transação.


2.3 Principais críticas ao IMF


Os críticos do IMF têm desferido uma série de comentários a respeito dessa forma de tributação, e os principais afirmam que ele é regressivo, cumulativo, estimula o uso de dinheiro em espécie e não permite desonerar as exportações. Todas essas críticas foram enfraquecidas ao longo dos anos por meio de estudos e com a experiência da CPMF, com exceção da questão da cumulatividade, que, por ser crítica teórica, exige validação empírica, como será mostrado a seguir. Quanto às previsões catastróficas, Brasil (2001) afirma que a própria experiência brasileira tem demonstrado que a maioria das teses pessimistas divulgadas na implementação do imposto (CPMF) não ocorreu: aumento da inflação e desintermediação financeira, por exemplo. Outras questões merecem uma melhor avaliação, como a afirmação de que a contribuição é fortemente regressiva.


2.3.1 Regressividade


Uma das principais críticas ao IMF é a regressividade, ou seja, ele imporia maior ônus para as famílias de baixa renda. Entretanto, pesquisas indicam que, em realidade, esse tipo de tributo é proporcional, pois os contribuintes são onerados por alíquota única. Assim, quem transaciona grandes valores irá pagar um tributo mais elevado comparativamente a uma pessoa que movimenta quantias menores. Desse modo, diversos estudos mostraram que a crítica da regressividade não pode ser confirmada.


Tavares (1995) descreveu o resultado de uma simulação para apurar a suposta regressividade do IPMF – posteriormente batizado de CPMF – sobre as pessoas físicas, e concluiu que esse tipo de tributo recai fundamentalmente sobre o segmento de maior renda. Segundo a autora, o argumento de que o imposto pune basicamente os mais pobres é falso, uma vez que, em seus exercícios, constatou-se que as alíquotas médias efetivas são maiores para as camadas de renda mais alta.


Paes e Bugarin (2006) chegam a conclusões semelhantes, dizendo que a CPMF é o imposto mais harmonioso do sistema tributário brasileiro. O ônus desse tributo sobre o orçamento das famílias era de 1,3%, ou seja, ele é uniforme em qualquer faixa de renda: não é regressivo, nem progressivo. O trabalho revela ainda que, entre os tributos mais prejudiciais em termos de impacto sobre as famílias de baixa renda, o ICMS, um IVA estadual tido pelos críticos da tributação sobre movimentação financeira como um imposto justo, é um dos mais importantes. Portanto, pode-se concluir que a tese da regressividade do IMF é um mito.


2.3.2 Estímulo à desintermediação bancária


Esta é uma crítica que a experiência da CPMF desmontou de maneira categórica. Vários autores levantaram a hipótese de que os clientes bancários passariam a operar majoritariamente com moeda em espécie. Albuquerque (2001) afirmou que o uso de contas bancárias é opcional, e a contribuição (CPMF) pode ser evitada pela simples desintermediação financeira. Isto é, apregoava-se que esse tributo levaria as pessoas e as empresas a deixarem de utilizar a moeda eletrônica, fato que não se confirmou durante sua aplicação por doze anos na economia brasileira. Não foi observada qualquer ameaça aos bancos por parte dos clientes para efetuarem saques de papel-moeda a fim de se livrarem do tributo.


A verdade é que, em um nível suave de taxação, a economia de imposto obtida com a consumação de negócios à margem do sistema bancário não compensa o custo do armazenamento e transporte de numerário, a insegurança, riscos de falsidade, ilegalidade de transações em moeda estrangeira etc. Em relação ao uso de papel-moeda, cabe repetir que medidas como a sobretaxação de saques e depósitos em dinheiro vivo e outras precauções dissuasivas, como a não validade jurídica de operações que vierem a ocorrer fora do sistema bancário, desestimularão qualquer tentativa nesse sentido.


2.3.3 Exportação de imposto


É certo que a desoneração na exportação é mais fácil no regime dos IVAs, mas também é factível no regime do IMF, embora mais trabalhosa. Ela teria de ser calculada com o acompanhamento empírico das cadeias produtivas, ou com exploração de matrizes de insumo-produto, e operacionalizada mediante créditos de imposto, rebates, devoluções ou subsídios equivalentes, não muito diferentes do que já se pratica hoje.


Nesse sentido, a alternativa é expandir dados que já foram ou são produzidos pelo IBGE, como as Tabelas de Recursos e Usos (TRU) e as matrizes insumo-produto, para determinar o montante de tributos envolvido na relação intersetorial no Brasil e, com isso, operacionalizar a desoneração de produtos exportados.


2.3.4 Cumulatividade


O IVA tem sido a alternativa que alguns críticos do IMF encontraram para a questão da cumulatividade, pois muitos deles acreditam que esse tipo de tributo é a solução de todos os problemas tributários do país. Vale relembrar que, desde o lançamento da ideia do Imposto Único, em 1990, quase todas as teses elaboradas pelos críticos foram refutadas por meio da experiência da CPMF. Hoje, os adversários dessa proposta de tributação se apegam apenas a uma delas, inerente a essa metodologia de arrecadação, que é a cumulatividade. Porém, a comparação desse tipo de imposto com a alternativa consubstanciada no IVA revela que a tributação sobre a movimentação financeira, mesmo cumulativa, gera mais benefícios e introduz menos distorções alocativas no mercado.


O Imposto Único é cumulativo e incide sucessivamente em cada etapa do processo econômico que se traduza numa movimentação financeira, todavia, isso em nada o descredencia como bom imposto. Aqui, é preciso advertir que a exigência da não cumulatividade é uma tolice. Não existe imposto perfeitamente não cumulativo, a não ser na imaginação teórica descolada da realidade ou no Diário Oficial.


Cumpre-se dizer que os impostos sobre valor adicionado comportam, em todos os lugares do mundo em que são praticados, as mais diversas exceções e regimes especiais, o que lhes confere graus apreciáveis de cumulatividade. O Brasil tem uma série de tributos cumulativos, entre os quais uns são execrados (parte do PIS/Cofins), outros tolerados (ISS, parte do ICMS e do IPI) e alguns ainda apreciados, como se não fossem igualmente cumulativos (IRPJ presumido e Simples). O Imposto Único não é diferente deles sob esse aspecto, mas exibe vantagens notáveis, como a simplicidade e o baixo custo.


Ademais, de acordo com a teoria do second best e as conclusões da moderna teoria da tributação ótima, não se pode afirmar a priori que um imposto cumulativo seja menos eficiente que os não cumulativos. Simulações apresentadas em Cintra (2009, cap. 2) mostram que um imposto cumulativo com uma alíquota baixa causa menos distorção sobre os preços se comparado a um sistema tradicional com tributos sobre valor agregado com alíquota alta. Por exemplo, um IMF com alíquota de 2,8% tem impacto de, no máximo, 17,7% sobre os preços de 128 produtos/setores analisados e, no caso da tributação sobre o valor agregado (ICMS, IPI, INSS patronal, PIS e Cofins), o ônus máximo é de 64,1%, utilizando-se os parâmetros das relações interindustriais brasileiras. Outro aspecto importante refere-se ao equívoco comum na avaliação de IMFs que advém da presunção de que tributos cumulativos condensam elevadas cargas tributárias geradas por longas cadeias de produção.

As cadeias de produção jamais podem ser descritas como curtas ou longas, visto que são sempre infinitas. Em realidade, qualquer produto ou serviço implica a contribuição de todos os demais setores da economia para sua produção, pois trata-se de um processo circular e que necessariamente utiliza insumos de vários outros setores que, por sua vez, também precisam de insumos de outros setores, e assim sucessivamente.


O que determina a carga de impostos de um tributo cumulativo é a relação entre insumos e valor agregado em cada estágio no processo de produção. Por exemplo, se um dado setor de produção compra insumos de uma determinada quantia e agrega valor em montante equivalente, a cumulatividade carregada das etapas anteriores de produção acha-se totalmente embutida no valor dos insumos adquiridos. O valor agregado nesta etapa de produção não sofre qualquer efeito cumulativo nesta mesma etapa, passando a fazê-lo apenas na medida em que a produção se transforma em insumo na etapa posterior.


Por fim, vale expor que as simulações apresentadas em Cintra (2009, p. 49-52) concluem que um IMF de 1% no débito e no crédito de cada transação bancária e que agregue valor equivalente a 100% sobre o valor dos insumos, por exemplo, terá apenas 3,86% de carga tributária no preço final, e que os efeitos da cumulatividade se exaurem muito rapidamente.


3 COMPARATIVO DO IMPACTO DE UM IMF E DE UM SISTEMA TRADICIONAL SOBRE A PRODUÇÃO


Um aspecto extremamente relevante quando se debatem propostas antagônicas em termos de sua sistemática é promover uma avaliação do impacto que elas provocam sobre a atividade produtiva. Inicialmente, cabe destacar que qualquer tributo tem efeito sobre os preços, ou seja, a ideia do imposto neutro é descabida. O indicado nesse caso é que se avaliem os sistemas, visando determinar aquele que causa menor distorção sobre a eficiência do processo produtivo.


Um estudo desenvolvido com base em dados das contas nacionais do IBGE e utilizando o cálculo matricial apurou que o IMF, embora seja um imposto cumulativo, causaria menos distorções nos preços finais dos bens e serviços em comparação com o sistema vigente, no qual há predominantemente impostos como o IVA, o IPI, parte do PIS/Cofins, o ICMS e o INSS sobre a folha de pagamentos. A análise do impacto nos preços de 128 setores da economia brasileira mostrou sensível redução de carga tributária e, consequentemente, de preços finais dos produtos, como pode ser observado na tabela 1, que resume o estudo desenvolvido.


TABELA 1


Outra evidência empírica comprovada nas simulações é a estimativa da distorção causada por cada modelo nos preços relativos comparativamente a uma situação com ausência de tributação. Parte-se de um cenário com alíquota tributária zero, e ao aplicarmos o IMF com a alíquota preconizada, há um desvio em relação a situação inicial de 2,76% nos preços relativos, enquanto no modelo tradicional, com as alíquotas vigentes no Brasil, a distorção sobe para 7,52%.


Observa-se, portanto, que além de introduzir menos distorções econômicas relativamente ao sistema tributário vigente, a implantação do IMF implicará significativa economia de recursos, que hoje são gastos com despesas administrativo-tributárias das empresas. Vale salientar que também haverá redução da economia informal e diminuição sensível dos custos de fiscalização e arrecadação na máquina estatal.


TABELA 2


A comparação dos efeitos de um IMF com tributos convencionais é um aspecto sobre o qual os analistas deveriam necessariamente se concentrar. É fundamental desmistificar a ideia de que a tributação sobre a movimentação financeira deve ser evitada porque é danosa à economia. Suescun (2004) concluiu que um tributo sobre transação financeira, como a CPMF, causa menos distorção do que impostos sobre ganhos de capital e sobre rendimentos do trabalho. Já Levy (2007), ex-ministro da Fazenda no Brasil em 2015, afirmou que a CPMF é hoje um dos tributos que gera menor distorção na economia.


4 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Parte expressiva do pensamento tributário contemporâneo estacionou em teorias e dogmas vigentes em meados do século passado, mantendo-se presa a conceitos e princípios ultrapassados que não se ajustam ao mundo contemporâneo. Ainda que os métodos administrativos de controle e a atividade do fisco tenham sido operacionalmente modernizados, as estruturas conceituais sobre as quais estão assentados os paradigmas usualmente defendidos nas propostas convencionais de reforma tributária continuam em grande parte em desacordo frente à realidade do novo modo de produção e circulação de bens e serviços que surge na sociedade atual.


O antigo paradigma fordista de produção industrial ainda inspira os modelos tributários convencionais, a exemplo dos métodos de arrecadação e controle baseados no sistema autodeclaratório com auditoria. No Brasil, a ausência de sintonia entre o pensamento tributário-burocrático vigente e o mundo real travou o andamento da reforma tributária.


Medidas isoladas atingindo questões tributárias pontuais visaram sobretudo aumentar a arrecadação sem que aspectos relacionados à eficiência alocativa dos recursos econômicos fossem levados em consideração. Nestas condições, tais iniciativas foram na contramão das necessidades do país. Não houve simplificação, custos não foram reduzidos e a iniquidade se aprofundou.


O cenário econômico global, baseado na tecnologia digital, exige uma forma de tributação inovadora, como o IMF, que traz inúmeras vantagens. A fiscalização torna-se mais simples, os critérios de taxação ficam mais transparentes e os custos por parte do poder público, e principalmente do setor produtivo privado, tornam-se menores. A simplificação do processo fiscal é evidente quando toda a arrecadação se concentra em um único tributo, incidente sobre uma única base que dispensa declarações, guias e controles burocráticos.


Baseando-se na experiência da CPMF, o IMF eliminaria virtualmente a sonegação, a corrupção fiscal e a economia informal, com custos administrativos ou de fiscalização pouco significativos. A arrecadação tributária seria efetuada automaticamente a cada lançamento de débito e crédito no sistema bancário, e a cada transação, as contas credora e devedora seriam debitadas em uma porcentagem fixa. Assim, em toda transação efetuada mediante cheque, cartão magnético ou qualquer outro tipo de ordem de pagamento, o sistema transferirá de forma automática o produto de arrecadação à conta dos Tesouros federal, estaduais e municipais, segundo critérios predefinidos.


Em resumo, o IMF é uma forma de tributação inovadora, em sintonia com a sociedade moderna, capaz de gerar expressivos ganhos de eficiência na condução da política fiscal brasileira e desonerar a produção doméstica e os salários. Transformá-lo como base da estrutura tributária do país criaria uma viga mestra para que a economia nacional possa alcançar a almejada retomada do crescimento econômico de longo prazo.

 

REFERÊNCIAS

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