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Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

O Plano Cavallo

Amanhã a Argentina começa mais uma experiência para conter a inflação. O austral será convertido livremente pelo Banco Central pela cotação de mercado. Há, contudo, um teto fixado de 10 mil austrais por dólar, que deverá ser a cotação válida "para sempre", segundo autoridades argentinas. Para que a estratégia dê certo, há dois requisitos: a sustentação da taxa de conversão e a total abertura da economia. Se isso ocorrer, a estabilidade de preços será imediata.


A abertura da economia já foi anunciada pelo governo. Com essa medida, estabelece-se um teto para os preços internos. A possibilidade de importações será um freio a qualquer ameaça de inflação interna em dólares. Apenas haverá alteração na estrutura de preços relativos. Por meio deste mecanismo, é que os conflitos internos terão de ser resolvidos. Se alguém ganha, outro tem que perder. O nível geral de preços se manterá estável.


O sucesso do plano depende também da manutenção da taxa de conversão. Para isso, deve haver disponibilidade de divisas para bancar qualquer volume de demanda por dólares. Aí as dificuldades materiais começam. Há dólares para cobrir quase toda a base monetária. Mas não há reservas para cobrir demandas que poderão rapidamente se materializar: títulos públicos no mercado que vencerão logo; necessidades de financiamento do setor público; remessas de divisas por conta da dívida externa - se não se declarar uma moratória.


Há três saídas para superar essas dificuldades: a obtenção de volumosos superávits fiscais, a colocação de mais dívida pública interna ou a obtenção de novos financiamentos externos. Os superávits fiscais, em valor equivalente às remessas externas acrescidas do custo da dívida interna, não serão obtidos a curto prazo; a colocação de grandes volumes de títulos públicos exige uma confiança no governo que provavelmente não existe; e os financiamentos externos, uma possibilidade concreta.


Assim, as condições para o sucesso do Plano Cavallo são rigorosas. Mas se elas pudessem ser satisfeitas, não haveria necessidade de dolarizar a economia. A taxa fixa de câmbio é apenas um atalho que permite maior rapidez na estabilização, desde que haja confiança no governo.


 

MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE AL-BUQUERQUE, 44 anos, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor de economia da Folha.

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