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Marcos Cintra

Livro: O Brasil e a Alca (parte 8/9)

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INVESTIGAÇÕES DE DEFESA COMERCIAL SOBRE

AS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS

(Números em 31 de dezembro de 2000)

21.                    A maior competição internacional decorrente da ampliação dos fluxos de comérciocertamente acirrará as disputas comerciais, e a tendência é que haja um incremento no uso dos instrumentos de defesa comercial.

22.                    No âmbito das negociações da ALCA, na área de defesa comercial, a SECEXparticipa de dois Grupos: (1) O Grupo de Negociação sobre Subsídios, Antidumping e Medidas Compensatórias (GNSAMC); e (2) o Grupo de Negociação sobre Acesso a Mercados – Salvaguardas (GNAM).

23.                    No Grupo sobre Subsídios, Antidumping e Direitos Compensatórios (GNSAMC), a

SECEX colabora na formulação da posição brasileira e, conseqüentemente, da posição do MERCOSUL naquele fórum. De uma forma geral, tem-se buscado um aprimoramento das regras da OMC, com o objetivo de restringir a discricionariedade das autoridades investigadoras, por meio do estabelecimento de critérios mais transparentes.

24.                    Este grupo tem como característica específica o fato de os Estados Unidos não tereminteresse na realização de qualquer discussão mais aprofundada sobre conceitos e metodologias para apuração da existência de dumping/subsídio e de dano por ele causado. Na IX Reunião do Grupo, realizada em novembro de 2000, a posição dos Estados Unidos ficou explícita ao propor que o capítulo sobre aplicação de medidas antidumping e compensatórias da ALCA se restringisse a reconhecer o direito que os membros teriam de aplicar sua legislação nacional. Tal posição, criticada por todos os países, permitiria um retrocesso em relação aos avanços já conquistados no âmbito da OMC.

25.                    Foram realizadas doze reuniões do Grupo, desde 1998. Ao longo de 1999, foramelencados temas a serem objeto de discussão, ressaltando que a lista negociada não é uma lista fechada, isto é, novos temas poderão ser incorporados à negociação. Em 2000, iniciou-se o processo de preparação de texto de um eventual acordo, com os países, apresentando propostas de redação de artigos, com base nos Acordos Antidumping e de Subsídios da OMC. Esse trabalho continua em andamento.

26.                    Na VI Reunião Ministerial realizada em Buenos Aires, em 7 de abril de 2001,buscou-se manter a possibilidade de ser negociado um eventual texto antidumping que possua efetivos avanços em relação ao texto da OMC, sem que a legislação nacional possa ser invocada para bloquear as negociações.

27.                    Os Estados Unidos, na primeira reunião do Grupo realizada em 2001, apresentounova formulação de sua proposta de texto original, substituindo a referência à legislação nacional por menção aos Acordos da OMC. Tal modificação, porém, não significou mudança efetiva da posição norte-americana, visto que reflete a não-disposição de aprofundar as regras hoje existentes.

28.                    Além da negociação de regras comuns para a aplicação de medidas antidumping e compensatórias, cabe ao Grupo discutir a viabilidade de aprofundamento das disciplinas sobre subsídios estabelecidas no Acordo da OMC.

29.                    Em 2001, conforme mandato, o Grupo deverá definir programa de trabalho arespeito.

30.                    No Grupo que trata sobre Salvaguardas (GNAM), em 2000, iniciou-se a negociaçãode um texto sobre regras para aplicação de medidas de salvaguardas preferenciais, com base em propostas apresentadas. Os resultados alcançados foram levados ao Comitê de Negociações Comerciais – CNC, o qual recomendou a intensificação das negociações, tarefa que vem sendo realizada ao longo deste ano.

31.                    As medidas de salvaguarda preferenciais irão se constituir na suspensão dosincrementos das preferências programadas ou na diminuição ou suspensão da margem de preferência acordada, ou, ainda, na imposição de restrições quantitativas.

32.                    O texto que vem sendo discutido tem focalizado, basicamente, o estabelecimento demecanismo de salvaguarda durante o período de transição. O MERCOSUL, no entanto, propôs que se discuta oportunamente a conveniência do estabelecimento de mecanismo após o período de transição.

33.                    Entre os principais pontos, que vêm sendo objeto de discussão, merecem destaque:

− aplicação da salvaguarda restrita às exportações de alguns países (se as salvaguardas seriam aplicadas bilateral ou plurilateralmente);

− forma de aplicação (se seriam aplicadas unicamente medidas tarifárias ou se existe a possibilidade de aplicação de restrições quantitativas);

− salvaguarda da OMC (se seriam negociados critérios adicionais para aplicação de medida de salvaguarda global – no âmbito da OMC);

− cota mínima de acesso (se haverá a possibilidade de ser garantida uma cota de importação baseada em períodos anteriores ao do surto de importações preferenciais).

34.                    Diante do exposto, o Brasil tem buscado prosseguir com determinação um trabalhoque visa ampliar, consolidar e aperfeiçoar o relacionamento comercial entre os países do Hemisfério.


DIREITOS ANTIDUMPING E MEDIDAS DE SALVAGUARDA EM VIGOR

1988/AGOSTO-2001



ANTIDUMPING E POLÍTICA DE CONCORRÊNCIA NA ALCA E NO MERCOSUL

José Tavares de Araújo Jr.


1. Introdução

Nas últimas duas décadas, as negociações sobre normas antidumping e o

estabelecimento de instrumentos antitruste de âmbito extraterritorial tornaram-se temas centrais em todos os processos contemporâneos de integração regional. Como se sabe, dentre os fatores responsáveis pela consolidação de experiências bem-sucedidas como a União Européia e o Acordo Austrália-Nova Zelândia, destacam-se justamente as soluções encontradas para estes dois temas. Nos casos da Área de Livre-Comércio das Américas (ALCA) e do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), uma análise comparada sobre o atual estágio destas questões é útil não só para identificar a evolução provável dos dois empreendimentos nos próximos anos, como também para desqualificar certos prognósticos freqüentemente divulgados no Brasil. O mais conhecido deles é o de que a implantação da ALCA implicaria o desaparecimento do MERCOSUL. Como veremos adiante, tanto em relação a medidas antidumping, quanto aos instrumentos de cooperação na área de política de concorrência, serão as soluções encontradas no MERCOSUL que provavelmente irão influenciar o desenvolvimento futuro da ALCA, e não o contrário.

O texto está organizado da seguinte forma: a próxima seção discute rapidamente as relações entre antidumping e política de concorrência, mostrando que, embora exista uma pequena superposição formal entre elas, estas políticas tratam de problemas fundamentalmente distintos. A primeira visa proteger indústrias que competem com importações, enquanto a segunda procura preservar normas de concorrência que assegurem a eficiência produtiva e o bem-estar do consumidor. A terceira seção analisa o estágio atual das negociações sobre normas antidumping no Hemisfério, com ênfase nas posições negociadoras do Brasil e dos Estados Unidos. O principal ponto ali desenvolvido é o de indicar as razões pelas quais a agenda da ALCA não contempla a eliminação das medidas antidumping entre os seus membros, enquanto no MERCOSUL este objetivo já consta da agenda desde a assinatura do Tratado de Assunção em março de 1991. A quarta seção chama a atenção para o fato de que tanto na ALCA quanto no MERCOSUL o marco institucional para a política de concorrência não implicará a criação de órgãos supranacionais, mas será baseado na cooperação entre as autoridades antitruste dos países-membros. Ocorre que apenas treze dos trinta e quatro países da ALCA possuem leis de concorrência, e o processo de adoção destas leis entre os países do Hemisfério tem sido particularmente lento nos últimos anos. Entretanto, no MERCOSUL, não obstante as limitações do Protocolo de Fortaleza, Brasil e Argentina já dispõem dos instrumentos necessários para iniciar a aplicação efetiva de uma política de concorrência com escopo regional. Por fim, a seção 5 resume as principais conclusões do trabalho.

2. Custos de proteção e condutas anticompetitivas

Ações antidumping são instrumentos de proteção típicos de economias abertas. Durante os últimos vinte e cinco anos, a difusão internacional destas medidas esteve diretamente vinculada aos processos de liberalização comercial, conforme vários autores já assinalaram (Miranda, Torres e Ruiz, 1998; Blonigen e Prusa, 2001; Tavares, Macario e Steinfatt, 2001). Elas começaram a ser utilizadas em meados dos anos setenta, justamente após a eliminação generalizada de barreiras comerciais entre as economias industrializadas, que havia sido promovida pelas sucessivas rodadas de negociações multilaterais do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) a partir de 1947. Assim, até o final da década de oitenta, os únicos usuários freqüentes de medidas antidumping eram Estados Unidos, União Européia, Canadá e Austrália.

Um novo ciclo iniciou-se na década de noventa, desta vez estimulado pelas reformas comerciais unilaterais implementadas por diversos países em desenvolvimento, a partir de meados dos anos oitenta. O ponto de inflexão ocorreu em 1993, com a emergência de seis novos usuários importantes de medidas antidumping: África do Sul, Argentina, Brasil, Coréia, Índia e México. No caso do Brasil, por exemplo, a legislação antidumping foi introduzida em 1987, com o objetivo explícito de criar mecanismos compensatórios para o processo de abertura comercial que iria começar com a reforma da tarifa aduaneira em 1988.

Numa economia aberta, a função cumprida pelas medidas antidumping é a de conferir proteção seletiva e temporária àquelas indústrias que não estão preparadas para enfrentar a concorrência de importações. Estas medidas possuem duas peculiaridades que as tornam particularmente úteis ao esforço de conciliar os objetivos da liberalização comercial com os de auxiliar a reestruturação de indústrias pouco competitivas internacionalmente. A primeira é a sua dupla seletividade, nos planos doméstico e internacional, que reduz o risco de conflitos comerciais generalizados. A segunda é a de que a rotina das investigações antidumping oferece aos exportadores do resto do mundo várias oportunidades para compartilhar as rendas de proteção com a indústria doméstica, através de acordos de preços, restrição voluntária da oferta exportada, investimento direto no país importador, etc. Desta maneira, não obstante as distorções eventualmente introduzidas nos padrões de comércio internacional, as medidas antidumping não são necessariamente nocivas aos interesses das indústrias exportadoras, já que os custos da proteção muitas vezes ficam restritos ao mercado doméstico do país importador.

No entanto, a maioria dos especialistas neste tema tende a concordar com a observação radical de Michael Finger (1993), segundo a qual “antidumping is a trouble-making diplomacy, stupid economics and unprincipled law” (p. 56). No plano diplomático, as investigações antidumping costumam gerar atitudes cínicas entre os governos envolvidos. Do lado do país importador, o governo é levado a acusar os exportadores de outros países de estarem praticando condutas desleais, mesmo quando a evidência empírica mostra que o problema decorre da desatualização tecnológica da indústria doméstica. Em contraposição, os governos dos países exportadores costumam lamentar a medida protecionista, mesmo quando estão cientes dos benefícios auferidos por suas indústrias. Do ponto de vista da política econômica, existe uma extensa literatura empírica mostrando que os custos impostos aos consumidores domésticos costumam superar amplamente os benefícios auferidos pelas indústrias protegidas por medidas antidumping, conforme atesta a recente resenha realizada por Blonigen e Prusa (2001). Do ponto de vista legal, a legislação antidumping autoriza condutas que as leis de defesa da concorrência visam punir explicitamente, como a fixação de preços, a restrição de oferta e a formação de cartéis.

Tal como outros instrumentos protecionistas, medidas antidumping são incompatíveis com o propósito de formar um espaço econômico unificado. Duas experiências bem-sucedidas no trato deste problema são a da União Européia e a do Acordo Austrália-Nova Zelândia, que aboliram as ações antidumping entre seus membros, ao mesmo tempo em que estabeleceram marcos regionais para lidar com os aspectos transfronteiriços do processo de concorrência.

Entretanto, ao contrário do que sugerem certas análises superficiais, em nenhum dos casos a política de concorrência foi introduzida para substituir as ações antidumping. De fato, o traço comum em ambas as experiências foi o de haver resolvido simultaneamente dois problemas distintos, embora remotamente relacionados, já que, no vocabulário antitruste, dumping é sinônimo de preço predatório.

Para abolir antidumping, o obstáculo relevante a ser enfrentado pelos governos é o de corrigir os desníveis de eficiência produtiva no interior da região. Isto implica explicitar os custos da reestruturação industrial e acordar a distribuição destes custos entre os membros do projeto de integração. Do lado da política de concorrência, a questão a ser resolvida é a de impedir que os benefícios da integração sejam destruídos por condutas anticompetitivas com dimensão regional. Para enfrentá-la, é necessário, em primeiro lugar, que existam instituições nacionais para regular o processo de concorrência no interior de cada país; e, em segundo lugar, que os governos escolham os mecanismos de cooperação para lidar com os casos de dimensão regional. Um aspecto interessante do Acordo Austrália-Nova Zelândia, que é útil tanto para a ALCA quanto para o MERCOSUL, foi o de haver superado estes desafios sem criar organismos supranacionais. Por outro lado, a União Européia demonstrou que é possível reconciliar, de forma disciplinada, metas de política industrial e regras de concorrência no interior de um espaço econômico unificado (ver Tavares, 2001).

3. Antidumping: as normas hemisféricas e a situação no MERCOSUL

Na ALCA, a negociação sobre normas antidumping é um tema que afeta preponderantemente os interesses dos cinco principais parceiros. Como indica a Tabela no 1, Estados Unidos, Brasil, México, Canadá e Argentina foram objeto de 435 das 485 investigações antidumping iniciadas por governos do Hemisfério durante o período compreendido entre 1987 e junho de 2000. Por outro lado, os governos desses cinco países foram autores de 410 daquelas investigações. A maioria dos demais países da região praticamente não usa este instrumento de proteção e é relativamente pouco afetada por ele, conforme mostramos em outro trabalho (Tavares, Macario e Steifatt, 2001). De fato, se excluirmos a participação dos países menores, quer como autores ou como objeto das investigações, veremos que 78% das ações antidumping envolveram exclusivamente as cinco maiores economias.


Tabela Nº1

AÇÕES ANTIDUMPING ENTRE OS NEGOCIADORES DA ALCA: 1987 – 2000

Entre os principais usuários de medidas antidumping nas Américas, Brasil e Estados Unidos são os únicos que sofrem mais ações do que aplicam. Este aspecto deveria estimular, pelo menos em princípio, posições negociadoras convergentes entre os dois países nesta área, algo que não ocorreu até o momento. Enquanto o governo brasileiro vem insistindo na necessidade de rever os critérios de aplicação deste instrumento no contexto da ALCA, o governo americano só admite abordar este tema no âmbito da OMC (ver Lindsey e Ikenson, 2001). A explicação corrente para tal divergência é a de que a posição brasileira visa proteger os interesses dos exportadores afetados pelas investigações enquanto a posição americana defende exclusivamente os interesses das indústrias locais que competem com importações.

Entretanto, conforme vimos na seção anterior, os fundamentos econômicos de ambas as posições são precários. Do lado americano, existem duas importantes correntes de opinião contrárias à posição oficial. Na comunidade acadêmica, muitos autores gostariam que os Estados Unidos abolissem unilateralmente as ações antidumping em todos os foros de negociação (ver Blonigen e Prusa, 2001), assumindo uma posição similar àquela que o Japão vem mantendo nos últimos vinte anos. Outra vertente crítica tem sido divulgada através dos artigos do Cato Institute, um centro de estudos superconservador, de onde saíram diversos membros da atual Administração Bush (ver Lindsey, 2000; Lindsey e Ikenson, 2001). Estes trabalhos sugerem que os Estados Unidos deveriam adotar uma posição similar à brasileira, conferindo atenção prioritária aos interesses dos exportadores nacionais.

Até o momento, contudo, o impacto político das opiniões acima tem sido aparentemente nulo, conforme ilustra uma carta assinada por sessenta e dois senadores em 7 de maio de 2001, apoiando a posição oficial. O texto informa ao Presidente Bush que qualquer mudança de atitude por parte da Administração quanto à legislação antidumping iria dificultar a aprovação do fast track e outras iniciativas na área de comércio exterior. A carta contou com a assinatura dos líderes de ambos os partidos e foi liderada pelo senador democrata Max Baucus, que, naquela data, declarou em plenário:

“If President Bush truly wants to win congressional support for fast track, he should make a clear and unambiguous statement in support of these laws and communicate this message directly to his staff and to U.S. trading partners.” (Inside U.S. Trade, May 11, 2001, p. 7.)


Outro ponto frágil da posição americana reside no delicado equilíbrio que aquele governo procura manter entre antidumping e antitruste, já que as ações antidumping geram situações que violam as leis antitruste, como vimos na seção anterior. Este conflito tem sido administrado com sucesso nos Estados Unidos através de um instrumento legal conhecido como doutrina Noerr-Pennington, que protege as empresas envolvidas em ações antidumping em relação às penalidades previstas nas leis antitruste. Este ponto tem sido apontado insistentemente na literatura, mas até o momento não foi incluído em qualquer agenda de negociação internacional.

Cabe notar ainda que a rigidez da posição americana não resulta apenas de pressões políticas domésticas, mas também de uma restrição institucional com sólidas raízes históricas.

Qualquer alteração na legislação antidumping daquele país afetará as funções da U.S. International Trade Commission (ITC), uma autarquia com ampla independência política fundada em 1916. Além ser responsável pela decisão final nas investigações antidumping, a ITC fornece recomendações ao Presidente, ao U.S. Trade Representative e ao Congresso em todos os temas relativos à política comercial, mas não participa de negociações internacionais. A comissão é dirigida por seis conselheiros – três republicanos e três democratas – e possui uma equipe com cerca de 360 profissionais. Os conselheiros, que não podem ser reconduzidos, possuem mandatos superpostos de nove anos, o que implica uma nova nomeação a cada 18 meses. A ITC acompanha de perto o debate acadêmico e político sobre protecionismo nos Estados Unidos, e alguns dos estudos mais completos sobre os efeitos do antidumping na economia americana foram feitos por técnicos da comissão (ver USITC, 1995; Gallaway e outros, 1999). Estes trabalhos ratificaram o consenso existente na literatura especializada, mostrando que os custos impostos aos consumidores americanos são muito maiores do que os benefícios auferidos pelas indústrias protegidas por medidas antidumping. Apesar de sua repercussão no mundo acadêmico, estes estudos não provocaram mudança alguma na conduta da ITC.

Do lado brasileiro, a conduta do governo na etapa final das negociações sobre normas antidumping na ALCA será, portanto, influenciada por três ordens de fatores:

a) a possibilidade de explorar as fragilidades da posição americana;

b) uma eventual aliança com os demais países interessados em mudar as regras atuais;

c) uma avaliação substantiva dos interesses brasileiros envolvidos na negociação.

Em relação ao último ponto, é importante lembrar, por exemplo, que segundo Prusa (1996) o resultado líquido das investigações iniciadas pelos Estados Unidos contra o Brasil no período 1980-1988 implicou ganhos positivos para os exportadores brasileiros. O estudo de Braga e Silber (1993) sobre o caso de suco de laranja não desmente os resultados de Prusa. Entretanto, não foram produzidos ainda estudos examinando a distribuição de custos e benefícios entre os exportadores brasileiros provocados pelas investigações referidas na Tabela no 1.

Em síntese, os assuntos abordados nesta seção revelam um contraste interessante entre a ALCA e o MERCOSUL. No plano hemisférico, os resultados prováveis das negociações em curso poderão variar entre a manutenção do status quo (caso prevaleça a posição americana) e a introdução de eventuais mudanças nas regras atuais, visando assegurar, por exemplo, maior transparência dos procedimentos, ou estimular o uso de medidas de salvaguardas em lugar de investigações antidumping, conforme sugerimos em outra oportunidade (Tavares e outros, 2001). No MERCOSUL, onde o principal usuário deste instrumento tem sido a Argentina (ver

Tabela no 1), os governos não conseguiram cumprir até o momento as metas estabelecidas no Tratado de Assunção, que incluíam a eliminação de ações antidumping na região. No entanto, o mecanismo que poderia criar as condições políticas para vencer tal obstáculo já havia sido identificado pelos governos desde 1986, quando foram assinados os protocolos bilaterais de integração Argentina-Brasil. O princípio acordado naquela oportunidade foi o de que os desníveis tecnológicos entre as estruturas produtivas dos dois países deveriam ser corrigidos através de investimentos diretos transfronteiriços. Embora o MERCOSUL tenha estimulado um vigoroso ciclo de investimentos na região durante os anos noventa (ver Chudnovsky, 2001), não foram criados os instrumentos que poderiam ter orientado as aplicações na direção pretendida pelos protocolos de 1986.

4. Cortesia positiva na ALCA e no MERCOSUL

Na Reunião Ministerial da Costa Rica, em março de 1998, os governos dos países do Hemisfério definiram um programa de trabalho para o Grupo de Negociação sobre Política de Concorrência – GNPC, que incluía quatro mandatos:

a) identificar os princípios básicos e os critérios de concorrência;

b) estabelecer instrumentos para garantir que os benefícios do processo de liberalização da ALCA não sejam prejudicados por condutas empresariais anticompetitivas;

c) desenvolver mecanismos para promover a cooperação e o intercâmbio de informações entre as autoridades reguladoras da concorrência;

d) estudar os temas relativos à interação entre comércio e política de concorrência, inclusive medidas antidumping.

Com exceção do quarto mandato, onde reaparecem as divergências sobre o tema antidumping, existe um amplo consenso entre os participantes em relação às demais partes do programa de trabalho do GNPC. Assim, no futuro Acordo da ALCA, o capítulo sobre política de concorrência provavelmente conterá um mecanismo institucional inovador, que pela primeira vez permitirá a cooperação entre um grupo de pelo menos treze países visando coibir condutas anticompetitivas com dimensão internacional. Até o presente, os únicos instrumentos existentes para lidar com tais condutas – sem o amparo de organismos supranacionais, como a Comissão Européia – são os acordos bilaterais de cortesia positiva, adiante comentados.

Contudo, a despeito do progresso que tal inovação poderá promover na área de política de concorrência, sua contribuição à formação da ALCA permanecerá limitada enquanto os demais vinte e um países da região continuarem excluídos do mecanismo de cooperação; e não há indícios de que esta deficiência venha a ser superada a curto prazo. Em 1990, somente cinco países latino-americanos possuíam leis de concorrência: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e

México. Entre 1991 e 1996, este grupo dobrou de tamanho, com a inclusão da Costa Rica, Jamaica, Panamá, Peru e Venezuela. Desde 1996, com exceção do Uruguai, onde algumas normas gerais sobre defesa da concorrência foram introduzidas no primeiro semestre de 2001, nenhum outro país do Hemisfério conseguiu aprovar leis deste tipo. Alguns países, como Bolívia, El Salvador, Guatemala, Nicarágua, República Dominicana e Trinidad & Tobago, possuem projetos de lei em distintos estágios de elaboração. No resto da região, o debate público sobre este tema ainda não começou.

4.1. O princípio da cortesia positiva

Um dos fundamentos da cooperação antitruste na ALCA será o princípio da cortesia positiva. Esta inovação foi introduzida na economia mundial nos anos noventa, através de acordos bilaterais entre os governos de alguns países industrializados, para lidar com o número crescente de casos de megafusões entre empresas transnacionais e de condutas anticompetitivas com dimensão internacional, e diante da ausência de instrumentos multilaterais para lidar com esses problemas. Tais acordos costumam ter o seguinte conteúdo:

a) mútua notificação das investigações iniciadas em cada país, desde que afetem os interesses do outro signatário, tanto na área de fusões e aquisições quanto na de práticas anticompetitivas. As notificações devem ser suficientemente detalhadas, a

fim de permitir que o outro signatário possa avaliar a relevância dos impactos (efetivos ou potenciais) de cada caso sobre a sua economia doméstica, e devem incluir a natureza das atividades sob investigação e penalidades previstas. Sempre que possível, as notificações incluem também os nomes e a localização das pessoas envolvidas;

b) os funcionários das agências de cada país podem visitar o outro país durante o curso das investigações. Cada país pode solicitar que o outro inicie uma investigação sobre condutas anticompetitivas ali vigentes, ainda que os danos ocorram exclusivamente no primeiro país;

c) assistência recíproca na localização de testemunhas, coleta de evidências e depoimentos no território do outro signatário;

d) encontros regulares das autoridades para discutir a evolução das respectivas políticas domésticas e intercambiar informações sobre setores econômicos de interesse mútuo.

Cortesia positiva é um neologismo que foi incorporado ao vocabulário antitruste para descrever situações em que dois países decidem aplicar de forma recíproca as normas de extraterritorialidade contidas em suas respectivas legislações. Assim, os acordos de cooperação acima descritos não implicam qualquer alteração nas leis nacionais e, de fato, todas as providências ali estabelecidas poderiam ser realizadas independentemente da assinatura de qualquer protocolo, já que o instrumento que confere poder jurídico àquelas ações não é o acordo de cortesia positiva, mas a lei nacional. Entretanto, acordos deste tipo cumprem importantes funções operacionais e políticas, como a de facilitar as investigações sobre eventos ocorridos no exterior, fortalecer a confiança mútua entre as autoridades antitruste e alertar o setor privado sobre a efetividade das novas disciplinas.

O acordo assinado pelos Estados Unidos e a União Européia, em 1991, tornou-se rapidamente o exemplo mais notável de cortesia positiva da atualidade. Desde então, este acordo vem originando um fluxo de notificações sempre superior a cem casos por ano, tendo acumulado o total de 1.162 ao final da década, dos quais 689 foram referentes a condutas anticompetitivas e 473 a fusões e aquisições. Um dos relatórios recentes da Comissão Européia descreve alguns aspectos da rotina operacional dessa cooperação:

“In all cases of mutual interest it has become the norm to establish contacts at the outset in order to exchange views and, when appropriate, to coordinate enforcement activities. The two sides, where appropriate, seek to coordinate their respective approaches on the definition of relevant markets, on possible remedies in order to ensure that they do not conflict, as well as on points of foreign law relevant to the interpretation of an agreement or to the effectiveness of a remedy. Cooperation under this heading has involved the synchronization of investigations and searches. This is designed to make fact-finding action more effective and helps prevent companies suspected of cartel activity from destroying evidence located in the territory of the agency investigating the same conduct after its counterpart on the other side of the Atlantic has acted.” (Comissão Européia, 1998, p. 339.)


Uma limitação óbvia dos acordos de cooperação bilateral é a sua reduzida eficácia para coibir práticas originadas em terceiros países, e este problema continuará existindo enquanto não houver um marco multilateral para regular o processo de competição internacional. Outra dificuldade diz respeito à troca de dados confidenciais nos casos de cartéis, sobretudo quando as informações foram obtidas através de acordos de leniência. Além disso, determinados casos de fusões e aquisições podem gerar conseqüências assimétricas, quando os ganhos de eficiência se concentram nas empresas de um país e as distorções advindas da concentração econômica se concentram no outro. Por exemplo, em 1997, a Comissão Européia exigiu uma série de condições para aprovar a fusão Boeing/McDonnel Douglas, enquanto que a intenção original das autoridades americanas era a de aprovar sem restrições aquela operação. Entretanto, após dez anos de experiência e mais de 1200 eventos, só houve um caso em que as duas partes não conseguiram superar as divergências, quando em 3 de julho de 2001 a Comissão decidiu proibir a compra da Honeywell pela General Electric, que os americanos gostariam de ter aprovado.

Assim, cortesia positiva não é uma panacéia, mas uma solução transitória para remediar parcialmente um problema de âmbito multilateral. Sua principal virtude é a de evitar que interesses nacionais conflitantes sejam abordados sob a perspectiva estreita das negociações mercantilistas setoriais. Ao invés proteger apenas os interesses dos exportadores e das empresas que competem com importações, os governos são levados a considerar outras dimensões do interesse nacional, como a eficiência agregada da indústria doméstica e o bem estar do consumidor. A experiência transatlântica, e outras como as da Austrália/Nova Zelândia e Canadá/Estados Unidos vem fornecendo ilustrações eloqüentes dos benefícios que esta mudança de enfoque promove.

4.2. Protocolo de Fortaleza

Tal como no caso de antidumping, a harmonização das políticas de concorrência consta da agenda do MERCOSUL desde o seu lançamento. De acordo com seu primeiro artigo, o Tratado de Assunção determinava:

“a coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais entre os Estados Partes – de comércio exterior, agrícola, industrial, fiscal, monetária, cambial e de capitais, de serviços, alfandegária, de transportes e comunicações e outras que se acordem –, a fim de assegurar condições adequadas de concorrência entre os Estados-partes; e”, portanto, “o compromisso [...] de harmonizar suas legislações, nas áreas pertinentes, para lograr o fortalecimento do processo de integração”.

Sob este marco ambicioso, os países do MERCOSUL assinaram em Fortaleza, em dezembro de 1996, um protocolo que fixou as diretrizes para uma política de concorrência comum na região. A implementação desse protocolo deveria implicar, entre outras inovações institucionais, que, em dois anos, todos os países-membros teriam um órgão autônomo responsável pela defesa da concorrência; que a legislação nacional abrangeria toda a economia; que o órgão responsável pela concorrência teria força suficiente para contestar outras políticas públicas, se necessário; e que os países-membros teriam visões comuns sobre a interação entre política de concorrência e outras ações governamentais. Em conformidade com a filosofia do MERCOSUL, o protocolo não criou organismos supranacionais, e a efetividade das medidas regionais dependeria do poder de fiscalização dos órgãos nacionais. Embora as metas definidas em Fortaleza contenham alguns aspectos similares ao princípio da cortesia positiva, tal semelhança é apenas formal, como veremos a seguir.

Naquele momento, as legislações nacionais sobre concorrência eram bem heterogêneas no MERCOSUL. Uruguai e Paraguai não tinham leis sobre essa matéria; na Argentina e no Brasil, embora existissem tais instrumentos jurídicos, seus desenhos, normas de cumprimento e finalidades gerais diferiam bastante. Na Argentina, o regime de concorrência compreendia apenas a prevenção de práticas desleais; e esta limitação só veio a ser superada em 1999, com a aprovação da Lei no 25.156, que, além de regular os atos de concentração, conferiu autonomia às autoridades antitruste, através da criação do Tribunal de Defesa da Concorrência. No Brasil, a Lei no 8.884, de 11 de junho de 1994, tornou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) uma autarquia com poderes para vigilar que as condições de concorrência não sejam distorcidas por outras ações do governo, como, por exemplo, os processos de privatização e os regulamentos de monopólios naturais. Além disso, aquela lei estabeleceu normas para controlar as concentrações econômicas, as práticas anticompetitivas passaram a ser definidas de maneira mais ampla, e o CADE começou a trabalhar com parâmetros mais precisos para avaliar tais práticas. Assim, em 1996, a legislação brasileira era a única que reunia as condições mínimas para obedecer os compromissos firmados no Protocolo de Fortaleza.

O Protocolo procura impedir práticas concertadas entre empresas concorrentes, bem como abusos individuais de poder econômico que visem restringir a competição nos mercados do MERCOSUL. Suas disposições se aplicam a atos executados por qualquer pessoa, física ou jurídica, privada ou pública, inclusive empresas estatais e monopólios naturais, desde que essas práticas tenham efeitos sobre o comércio entre as partes. A lista inclui, dentre outras, colusão de preços, destruição de insumos e produtos acabados, divisão de mercado, adulteração de licitação, acordos exclusivistas, recusa a negociar e preços predatórios.

A Comissão de Comércio do MERCOSUL (CCM) e o Comitê para a Defesa da Concorrência (CDC) são os órgãos executores do Protocolo. A função da CCM é julgar, enquanto a do CDC é responder pela investigação e avaliação dos casos. Modelados pela lei brasileira, o processo e o julgamento dos casos são conduzidos em três estágios. O processo é iniciado perante a autoridade responsável pela fiscalização da concorrência de cada país a pedido da parte interessada. O órgão de concorrência, após a determinação inicial de que a prática tem implicações para o MERCOSUL, pode submeter o caso à CDC para uma segunda determinação. As duas avaliações deverão seguir uma regra de análise de motivos, em que se devem fornecer a definição do mercado relevante e provas da conduta e dos efeitos econômicos. Com base nessa avaliação, a CDC decide se a prática viola o Protocolo e recomenda as sanções ou outras medidas a serem impostas. O parecer da CDC é submetido à CCM para o julgamento final por meio de uma diretriz. Como parte desses procedimentos, o Protocolo contém disposições sobre medidas preventivas e garantias de cessação. Este mecanismo permite que o acusado elimine a prática investigada em conformidade com certas obrigações assumidas junto à CDC. O acompanhamento dessas medidas e o cumprimento das sanções recaem no âmbito da competência das autoridades nacionais de concorrência.

A dicotomia entre o escopo normativo do Protocolo de Fortaleza e o estado das instituições antitruste dos países-membros implicou uma série de inconsistências que estão retardando a execução das metas definidas em 1996. A limitação fundamental reside no processo decisório acima descrito, onde as autoridades nacionais antitruste ficaram reduzidas à condição de conselheiras da CCM. Ao transferir o poder decisório à CCM, o protocolo trata os conflitos oriundos do processo de concorrência como se fossem disputas mercantilistas. Não por acaso, o art. 2o estabelece que o âmbito de aplicação das normas abrange apenas eventos que tenham impacto sobre o comércio entre as partes. Desta maneira, permanecem impunes várias práticas comuns no setor de serviços, por exemplo, onde o poder monopolista de uma empresa estabelecida num país pode ser suficiente para impor restrições à qualidade dos serviços oferecidos no país vizinho, ou influir na estrutura de preços domésticos, sem provocar conseqüências evidentes nos fluxos de comércio. Além disso, o protocolo impede que as autoridades antitruste cumpram uma função estratégica no processo de integração, que é a de cooperar com as contrapartes dos países vizinhos na promoção da eficiência produtiva e do interesse do consumidor em âmbito regional, conforme vimos na discussão sobre cortesia positiva. De fato, são usuais conflitos transfronteiriços em que, de um lado, as autoridades antitruste da região encontram-se unidas no combate a uma determinada prática; e, de outro, órgãos de governo, empresas ou associações privadas dos respectivos países estão aliados na defesa dos privilégios advindos daquela prática. O protocolo não contempla este tipo de conflito.

Em artigo recente, Félix Peña (2001) apresentou uma ampla lista de providências voltadas à implantação do protocolo e à correção de suas falhas. Uma parte da lista relembra os compromissos que os governos já deveriam ter cumprido desde dezembro de 1998, como a edição de normas regionais para controlar fusões e aquisições (art. 7o) e as disciplinas sobre ajudas estatais (art. 32); e outros que pelo menos já deveriam estar em andamento, como o programa de cooperação entre as agências antitruste do MERCOSUL (art. 30). A lista também contém sugestões para melhorar a qualidade do processo decisório definido no capítulo 5, como a nomeação de painéis de peritos independentes para julgar os casos de dimensão regional, e de instâncias de apelação. Além disso, Peña aponta a necessidade de programas de cooperação técnica internacional, sobretudo para apoiar o processo de formulação de leis e de criação de agências antitruste no Paraguai e Uruguai. Por fim, ele destaca a importância da cooperação bilateral entre Argentina e Brasil.

A proposta esquematizada adiante aborda apenas o último ponto da lista acima e, por motivos práticos e estratégicos, posterga os demais. A razão prática é que Argentina e Brasil não necessitam do Protocolo de Fortaleza – nem tampouco do mecanismo a ser implantado na ALCA – para coordenar suas políticas de concorrência. Desde 1999, com a reforma da legislação argentina, os dois países se tornaram os únicos na América Latina cujas leis de concorrência possuem efeitos extraterritoriais, seguindo uma tendência internacional já adotada por diversas economias industrializadas. Este estatuto fornece amparo jurídico suficiente para qualquer tipo de ação conjunta em matéria antitruste, conforme vimos anteriormente. A razão estratégica é que, uma vez iniciada a cooperação, novas dimensões do processo de integração no MERCOSUL começarão a atrair a atenção da imprensa, dos governantes e da opinião pública. Ao lado do noticiário usual sobre saldos comerciais, política cambial e conflitos setoriais, gradualmente novos temas ganharão relevância, onde os aspectos proeminentes estarão relacionados com poder econômico, eficiência produtiva, oportunidades de investimento, emprego e bem estar do consumidor. Esta mudança no foco do debate público poderá criar as condições políticas para a realização de objetivos meritórios do protocolo, como a abolição das medidas antidumping e a racionalização dos incentivos fiscais, além gerar evidências na direção de um marco alternativo para regular as condições de concorrência na região.

Assim, em contraste com a ampla lista de providências indicadas por Félix Peña, a discussão anterior sugere ignorar temporariamente o Protocolo de Fortaleza, e aguardar o momento oportuno para reescrevê-lo. Neste ínterim, a seguinte agenda mínima poderia ser implementada pelas autoridades antitruste argentinas e brasileiras:

− Anunciar que, em virtude dos efeitos extraterritoriais das leis de ambos países, as condutas anticompetitivas e os atos de concentração com impacto regional passariam a ser investigados conjuntamente pelas autoridades. Os procedimentos da cooperação bilateral seriam de conhecimento público e compreenderiam as rotinas usuais nos acordos de cortesia positiva.

− Tal como faz regularmente a Comissão Européia, as autoridades divulgariam não só os casos resolvidos, destacando os critérios que orientaram as decisões, como também os eventuais conflitos de interesses nacionais e seus respectivos fundamentos.

− Similar publicidade seria conferida aos impactos que os casos examinados estariam provocando nos mercados domésticos do Paraguai e Uruguai, com o objetivo explícito de provocar o debate público sobre questões da concorrência, e eventualmente estimular o progresso do direito antitruste naqueles países.

− Com base na experiência acumulada após haver resolvido um número razoável de casos importantes, as autoridades antitruste apresentariam aos seus respectivos governos uma redação alternativa para o Protocolo de Fortaleza, que finalmente conteria as normas adequadas para regular a concorrência no MERCOSUL.

5. Conclusão

Este trabalho procurou mostrar que a ALCA e o MERCOSUL serão, por muito tempo, projetos de integração incompletos e imperfeitos. Além disso, no plano multilateral, os temas aqui abordados dificilmente sofrerão mudanças relevantes no futuro próximo, sobretudo na área de política de concorrência, já que atualmente apenas as economias industrializadas e um reduzido número de países em desenvolvimento possuem instituições para lidar com este tema. Do ponto de vista dos interesses brasileiros, os três foros de negociação, ademais de interdependentes, são igualmente prioritários; e a despeito das dificuldades atuais no MERCOSUL, a trajetória factível para a construção de instituições sustentáveis partirá do particular para o geral.





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