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Marcos Cintra

Reforma tributária contra os serviços, e a esperança no Senado

Com a reforma tributária, os prestadores de serviços intensivos em mão de obra passarão de uma tributação média em torno de 12% para 28%, conforme indicado pelo governo. Este percentual é muito maior do que o aplicado em países como Canadá (5%), Japão (8%) ou na média da Europa (21,3%). Inevitável que isso afete os preços. No entanto, especialistas dizem que, num primeiro momento, os empresários do setor de prestação de serviços tentarão absorver esse custo extra dentro da empresa para não perder clientes, mas com quedas significativas de margem de contribuição e de lucros.


Responsável por 70,9% do Produto Interno Bruto (PIB) e mais de 65% dos empregos brasileiros, o setor de serviços inclui restaurantes, bares, transportes, planos de saúde, comércio, TI, logística, limpeza, vigilância, escolas, mecânicos, manicures, cabeleireiros, escritórios de advocacia, contabilidade, arquitetura, medicina, engenharia, entre muitos outros. A maioria dessas empresas são pequenas, muitas vezes familiares, onde os próprios sócios trabalham. O impacto nos preços será gradativo, mas inevitável, afetando principalmente a população de baixa renda, que não conseguirá absorver esse aumento de custo.


Segundo estudos de José Roberto Afonso, a reforma tributária pode reduzir o lucro líquido de muitas empresas de serviços em até 80%.


A CNC reportou que, se a nova alíquota da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) for de 25%, (e será de pelo menos 28%) o setor de serviços poderá despedir cerca de 3,8 milhões de funcionários. Na prática, a carga tributária pode aumentar mais de 107%, variando conforme o tipo de atividade. As consequências incluem aumento da inflação, desemprego e redução no crescimento econômico.


Entre perder clientes ou sofrer prejuízo, muitas empresas podem optar pela evasão fiscal. Especialistas preveem um aumento significativo da economia informal, atualmente em torno de 17% do PIB, afetando mais os pequenos negócios vindos do Simples do que os grandes escritórios ou empresas.


No setor de serviços alimentares, como bares e restaurantes, a situação é ainda mais crítica. Além do aumento da carga tributária sobre os serviços, haverá também altos impostos sobre insumos como alguns alimentos e aluguéis, encarecendo os preços finais.


Recuperando-se dos efeitos da pandemia de covid-19, os bares e restaurantes enfrentam um cenário desafiador. Dados da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) mostram que apenas 36% das empresas do setor obtiveram lucro em 2023, e 41% delas estão enfrentando dívidas, incluindo impostos federais (77%), estaduais (46%) e encargos previdenciários (36%). Um aumento na carga tributária neste momento seria devastador.


A reforma aprovada pela Câmara prevê isenções e reduções de alíquotas de até 60% para saúde, educação, transporte, produção cultural, entre outros. No entanto, os detalhes dependerão de leis complementares ainda em discussão, e de leis ordinárias ainda desconhecidas. Se essas leis e suas regulamentações não alterarem significativamente os parâmetros da reforma, pequenos comerciantes, donos de bares e restaurantes, hotéis e empresários do turismo serão severamente impactados, mesmo com um tratamento tributário específico, conforme a EC 132.


Prestadores de serviços altamente intensivos em mão de obra, como serviços temporários, limpeza, conservação e segurança terão desafios ainda mais graves a serem enfrentados, pois não foram comtemplados com qualquer tratamento diferenciado, como outros setores.


O PLP 68 está agora no Senado. Sem relator, e ainda em fase de discussões internas, lideradas pelo senador Izalci Lucas (PL-DF).


Esta é a grande oportunidade para o Senado corrigir os erros gritantes que foram feitos na tramitação da reforma. É essencial que os parlamentares aproveitem este momento para realizar um debate robusto e incluir as alterações necessárias que garantam uma tributação justa e equilibrada para todos os setores da economia.


 

Marcos Cintra é doutor em economia pela Harvard University (EUA) e professor-titular e vice-presidente da FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi secretário especial da Receita Federal.


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