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Marcos Cintra

Crise iminente

A economia global está à beira de uma nova crise que deve perdurar por um longo período. A causa da atual turbulência reside na fragilidade das finanças públicas dos países ricos.


Tudo começou cerca de dez anos atrás quando a especulação tomou conta do mercado financeiro nos Estados Unidos e as autoridades daquele país se omitiram quando deveriam impor limites à farra que corria solta. Em 2001, o Federal Reserve reduziu juros e estimulou o mercado imobiliário a conceder empréstimos até para pessoas que não tinham como comprovar capacidade de pagamento.


Os empréstimos de alto risco, denominados subprime, cresceram rapidamente, e os bancos montaram uma complicada engenharia financeira classificando essas operações como seguras. Uma bomba estava sendo armada para explodir quando os juros subissem e a inadimplência crescesse. Isso começou a acontecer em 2004, e a iminência de uma crise passou a ser anunciada em 2006. Em 2008, a bolha imobiliária nos Estados Unidos estourou, e a incerteza tomou conta da economia mundial.


Com a crise em andamento, os governos tentaram evitar o pior injetando liquidez no sistema bancário para conter a quebradeira e adotaram medidas de estímulo à economia para evitar uma recessão prolongada. De imediato, o Congresso norte-americano aprovou um pacote destinando US$ 700 bilhões para socorrer banqueiros, e o G-20 injetou US$ 1 trilhão para começar a enfrentar a turbulência.


Quase três anos se passaram desde que o banco Lehman Brothers quebrou, marco da crise de 2008, e uma nova turbulência começa a tomar corpo por conta dos efeitos das medidas adotadas para evitar um colapso global. Agora a crise deriva dos gastos dos governos para salvar suas economias. A gastança foi tanta que as dívidas soberanas e os déficits públicos cresceram muito acima do aceitável.


Na Europa, países como Grécia, Irlanda, Portugal, Itália e Espanha registram expressivo desequilíbrio orçamentário, e suas dívidas públicas estão sob a ameaça de calote. A resistência da sociedade quanto ao aumento de impostos e à redução de despesas está gerando conflitos que ganham as ruas. Há tensão social de grande magnitude naquele continente, dificultando os ajustes fiscais necessários.


Nos Estados Unidos, o endividamento atingiu o limite de US$ 14,3 trilhões e só foi autorizado um novo teto depois de um embate político histórico no Congresso daquele país, e cuja aprovação está condicionada à adoção de medidas que vão de cortes nos gastos a aumento de tributos. Contudo, o acordo norte-americano não foi capaz de prover um plano fiscal abrangente, o que cria a expectativa de aumento do endividamento mais à frente. Há previsões apontando que, dentro de seis meses a um ano, será preciso um novo aumento no limite da dívida.


Estima-se que a recessão nos países ricos pode durar entre cinco e dez anos. Apesar dos governos gastarem trilhões de dólares, o desemprego continua alto, as empresas não investem, consumidores evitam as compras e bancos não conseguem tomadores para os empréstimos fora do sistema financeiro. O dinheiro não está fluindo.


O endividamento e o desequilíbrio fiscal paralisam as duas maiores economias do planeta. A zona do euro e os Estados Unidos representam quase 50% do PIB global, e em um mundo cada vez mais integrado, a contaminação é certa, sobretudo para países com maior abertura comercial, o que não é o caso do Brasil.

 

Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas. www.marcoscintra.org

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