A CPMF surgiu com base na proposta do imposto único, apresentada em 1990. A ideia era criar um tributo sobre a movimentação financeira para substituir vários dos tributos de natureza declaratória. No entanto, a proposta original foi desvirtuada, e o que era para ser único acabou se tornando apenas mais um imposto. No entanto, a experiência da CPMF foi extremamente positiva e serviu para desmentir uma série de previsões negativas feitas pelos críticos dessa forma de tributação durante sua discussão.
A CPMF se revelou um bom tributo. Mostrou excelente produtividade quando comparada sua baixa alíquota com a arrecadação gerada. Seu custo administrativo para o governo e para as empresas foi muito baixo em comparação com os tributos tradicionais. Além disso, foi eficiente no combate à sonegação. Estudos mostraram que se trata de um tributo uniforme, não regressivo como se afirmava. Um estudo da Receita Federal de 2001 ("CPMF - Mitos e Verdades sob as Óticas Econômica e Administrativa") e um artigo do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, quando era secretário da Fazenda do Rio de Janeiro em 2007 ("CPMF gera menos distorções na economia que outros tributos") relatam as qualidades da CPMF. Sua extinção em 2007 se deu por razões políticas e não técnicas.
No que diz respeito à necessidade de sua volta, é importante destacar que o atual ajuste fiscal em andamento carrega o vício de recorrer à elevação de tributos sempre que há necessidade de equilibrar o orçamento público. O ajuste deve se dar cortando despesas em vez de aumentar a carga tributária, que já é alta quando se considera a renda per capita brasileira.
A volta da CPMF seria bem-vinda se ela fosse usada para começar a substituir alguns dos atuais tributos, conforme idealizado no projeto do imposto único. Ela poderia ser recriada em conjunto com a PEC 474/01, que institui o Imposto Único Federal e que está parada no Congresso desde sua aprovação em 2002 pela Comissão de Reforma Tributária da Câmara dos Deputados. Dadas as qualidades comprovadas desse tipo de imposto, haveria impacto positivo sobre todos os agentes produtivos e o poder público. Trabalhadores e consumidores ganhariam com a elevação da renda disponível e do poder aquisitivo, empresas se beneficiariam da redução dos custos tributários e administrativos, e o governo teria ganhos com o combate à evasão de arrecadação e a redução nos custos de fiscalização.
No entanto, é preciso reconhecer que, apesar de não ser favorável a aumentar ainda mais a carga tributária, a reinstituição da CPMF deveria ser considerada se esta for a única alternativa viável. Os oito primeiros meses do ano mostraram que o governo é fraco, que o Congresso é populista e que a sociedade brasileira não está disposta a abrir mão de sua dependência em relação ao poder público. A sociedade brasileira está viciada em favores governamentais, em privilégios e em subsídios, e os políticos não vão desafiar seus eleitores e aprovar cortes de gastos que reduzam as transferências do governo.
O pior dos mundos é continuarmos nessa desorganização orçamentária que está aumentando o déficit e a dívida pública. Sendo assim, se não houver alternativa viável, a reinstituição da CPMF pode ser a única opção para viabilizar o reequilíbrio fiscal e evitar um desastre sem precedentes para o país.
Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto Único. É Subsecretário de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paul