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Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Ato de coragem 2

Na semana passada, abordou-se a necessidade de independência do Banco Central em um programa de estabilização. Hoje, pede-se um segundo ato de coragem do governo.


O Programa de Reconstrução Nacional, lançado pelo presidente Collor no primeiro aniversário de seu governo, é mais uma tentativa de liderar um projeto de desenvolvimento nacional. A sociedade já ouviu as mesmas promessas. Concretamente, porém, ainda não surgiram resultados positivos, embora várias iniciativas já tenham sido tomadas neste primeiro ano de governo.


O PRN busca retomar para o presidente a iniciativa de liderar um debate nacional. Repete as bases de um louvável programa de governo, dentro de uma tônica modernizante e liberal. Porém, a mera reenunciação de fórmulas já consagradas e a ausência de propostas concretas — que poderiam vir na forma de projetos de lei — tiram do presidente a possibilidade de encaminhar uma discussão nacional acerca de um projeto de desenvolvimento.


O mais preocupante, porém, é que o Executivo não reúne em seus quadros pessoas capazes de conduzir a sociedade brasileira em um projeto de tal envergadura. Nesse sentido, há que ler um segundo ato de coragem. Não há como implementar um programa de governo se os responsáveis por sua implementação não se mostram capazes de transmitir à sociedade seu inequívoco compromisso com as bases conceituais do projeto que propõem implementar.


Há que haver, como pré-requisito básico para o sucesso, uma equipe econômica cujo padrão de comportamento não deixe a mínima margem de dúvida acerca de seu compromisso com o projeto liberal que o presidente está propondo. Há que haver nomes que, por eles mesmos, imponham um padrão de confiabilidade que torne impensável, inexequível, qualquer alteração de rumo capaz de arranhar, ainda que de leve, a confiança neles depositada.


Com regras estáveis, respeito pelas instituições e competência técnica, o governo reconquistaria prestígio para detalhar e implementar o PRN. O projeto foi bem recebido, ainda que com grande incredulidade no tocante à sua implementação. Superar esta descrença é o principal obstáculo a ser removido em sua viabilidade técnica e política.


 


MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE AL-BUQUERQUE, 44 anos, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e consultor de economia da Folha.

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