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Marcos Cintra

A constituinte exclusiva

O pior cego é o que não quer ver. Sempre foi de meridiana clareza que a revisão da constituição seria um retumbante fracasso.


A experiência de 1988 foi gritantemente esclarecedora. A classe político-partidária não serve para elaborar a Constituição. Não resiste à demagogia e subordina as regras gerais da sociedade a seus interesses e compromissos imediatos. Além disso, a coincidência do período revisional com o início do calendário eleitoral, temperado com os eflúvios e odores da CPI da Corrupção, resultou em uma combinação fatal a qualquer pretensão responsável de revisão constitucional. Mas a hora da verdade sempre chega, ainda que tardiamente. A revisão fracassou.


Não é o caso de chorar sobre o leite derramado. O mal já está feito. Mas a incuria da classe política é alarmante. O governo deveria estar atento a estas dificuldades, já que o sucesso do plano de estabilização dependerá em grande parte, das reformas institucionais que a revisão poderia concretizar.


Infelizmente, a revisão não foi realizada antes do plano de estabilização, como seria desejável. As reformas estruturais da economia deveriam anteceder as medidas fiscais e de controle da inflação inercial. Somente assim, a queda da inflação teria sustentação, evitando que a espiral inflacionária retomasse seu impeto altista, como ocorreu no plano cruzado, de triste memória.


O atual cenário político institucional mostra que dificilmente a reforma da Carta cumprirá o importante papel de sustentar de forma permanente o controle da praga inflacionária. Lamentavelmente.


Mas há que se buscar alternativas.


A revisão deve ser adiada para 1995.


Há vantagens nesta opção. É melhor adiar do que forçar o passo nas semanas restantes da atual revisão, o que resultaria em um tratamento apenas perfunctório dos grandes temas nacionais. Esta superficialidade, recheada com inevitáveis ingredientes políticos que a ocasião imporá, irá resultar em alterações constitucionais indesejáveis e prejudiciais a médio e longo prazos. Além disso, apressar o atual processo revisional, considerando-o encerrado apenas para cumprir um calendário formal, seria perder a agilidade que caracteriza a revisão, relativamente aos processos regulares de emendas à Carta Magna. Cabe lembrar que fora da revisão, as alterações só ocorrem após duas votações na Câmara e duas no Senado, com exigência de aprovação de três quintos dos parlamentares em cada uma delas.


O adiamento abrirá oportunidade para amplos debates com os candidatos sobre os grandes temas nacionais. Permitiria ainda aos futuros mandatários formarem maioria no parlamento, com a qual se daria início aos projetos complementares que teriam obtido legitimidade pelo voto popular nas eleições que se aproximam.


O monopólio de participação dos políticos na Assembleia Constituinte deve ser quebrado.


Esta opção permitiria a colaboração de todos os segmentos da sociedade. Os membros poderiam ser eleitos desvinculados de partidos, com candidaturas independentes. A participação dos políticos seria garantida pela indicação de um representante constituinte de cada partido, que seria o porta-voz dos programas e projetos de sua agremiação política.


Os constituintes eleitos devem se tornar inelegíveis. Para desencorajar a participação de políticos engajados em seus projetos pessoais, os eleitos se tornariam inelegíveis por oito anos, exceto os representantes dos partidos. A inelegibilidade garantiria a presença de elementos representantes de toda a sociedade, e excluiria carreiristas e demagogos.


A constituinte deve ser exclusiva.


Os membros da constituinte seriam eleitos com a função específica de revisar a Carta, e a assembleia seria dissolvida imediatamente após o término dos trabalhos. Esta opção atrairia a participação dos vários segmentos da sociedade, desejosos de participar da revisão, mas que não atuam na vida político-partidária. Haveria maior representatividade e mais participação.


Salvar o atual processo revisional implicaria riscos inaceitáveis. Melhor seria abortá-lo imediatamente, e preparar o caminho para uma revisão mais responsável no ano que vem.



Marcos Cintra é vereador em São Paulo pelo PPR.




Publicado no Diário Popular (Campinas - SP)

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