A Câmara Municipal paulistana aprovou neste ano um instrumento de extrema importância para viabilizar a obtenção de recursos para a execução de obras de infra-estrutura econômico-social na cidade.
Trata-se do projeto de lei, de minha autoria, que cria o Cepac -Certificado de Potencial Adicional de Construção-, com vistas a securitizar direitos de construir na cidade. Inovador, o Cepac provavelmente se tornará referência na solução de problemas de financiamento de investimentos públicos.
Por isso, o certificado gerou resistência naqueles avessos ao exercício da criatividade. Um deles foi o vereador José Eduardo Martins Cardozo (PT), que impetrou mandado de segurança contra o projeto, alegando irregularidade no seu trâmite. O pedido foi indeferido pelo Ministério Público, diante da total incompetência e impertinência na sua fundamentação jurídica.
A proposta surgiu de três constatações:
a) não há espaço para elevação do ônus tributário para a realização de investimentos públicos;
b) os investimentos não podem mais ser viabilizados via endividamento, não só em face do grau de exposição já alcançado, mas, também, devido à exaustão das fontes tradicionais de financiamento;
c) os investimentos governamentais beneficiam, em diferentes escalas, o setor privado, apesar de seu custo ser bancado pela sociedade por meio de impostos. É o caso da valorização imobiliária gerada por investimentos governamentais em obras financiadas com recursos públicos. Nada mais justo do que o setor privado compartilhar, de forma compensatória, esses investimentos com o setor público. Os Cepacs podem fazê-lo.
Certificados representativos de direitos adicionais de construção, têm características próprias: só podem ser usados quando houver alteração do potencial construtivo de terrenos em áreas permitidas por decisão da Câmara; são comprados em leilões públicos; e mostram-se proveitosos na captação de recursos não-tributários para investimentos do governo em infra-estrutura e no retorno de parte dos lucros gerados para a coletividade.
Um exemplo seria um terreno situado em uma região cujo zoneamento permite construir, no máximo, duas vezes a sua área. Se, após mudança no zoneamento aprovada pela Câmara, seu dono for autorizado a construir quatro vezes a área do terreno, ele terá de pagar pelo direito de construir o dobro do permitido anteriormente.
Esse pagamento é feito em Cepacs adquiridos em leilões ou no mercado desses títulos. Os recursos assim obtidos serão utilizados na execução de investimentos públicos na própria região.
Os Cepacs ajudarão a viabilizar projetos de restauração e de manutenção de bens tombados, de melhorias em cortiços e de desfavelamento. Nesse caso, são promissoras as perspectivas de verticalização e urbanização de favelas situadas em terrenos particulares.
Em troca de Cepacs, seus proprietários podem transferir sua titularidade para a prefeitura, que a repassará aos moradores da área, alargando o alcance social, por exemplo, do já bem-sucedido Projeto Cingapura. Instrumentos de arrecadação voluntária transacionados livremente pela Bolsa de Commodities, seus preços serão determinados com liquidez e clareza. Livres de operações de endividamento, serão resgatados contra o direito de construir, sem interferir no passivo municipal.
A solução representada pelos Cepacs tende a ser acolhida e seguida por outras metrópoles no Brasil e no mundo. Por quê? Porque aqui já obtiveram êxito no financiamento das obras da nova Faria Lima. Tanto que já se cogita empregá-los no financiamento da ampliação do metrô.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA).