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Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Corrida contra o tempo


Não elegemos Fernando Henrique no primeiro turno das eleições para premiar-lhe com a oportunidade de fazer turismo na Praça Vermelha. Queríamos dar-lhe tempo para negociar as reformas necessárias para a estabilização e retomada do crescimento da economia brasileira.

Infelizmente, as recentes declarações do presidente-eleito no sentido de que as reformas constitucionais não recomendariam pressa, indicam que tudo ficará para mais tarde.

Foi para viabilizar a consolidação imediata do Plano Real que a sociedade brasileira se agrupou em apoio à sua candidatura. A campanha presidencial convenceu-nos de que esta seria sua prioridade absoluta. Com certeza, não lhe falta competência para dar início imediato aos trabalhos de remontagem da economia brasileira. Mas pode estar faltando apetência.

Inúmeras medidas e decisões poderiam ser tomadas, ainda com o atual Congresso. Há que vencer a implacável corrida contra o tempo em que se transformou o Plano Real. A indefinição dos rumos fundamentais da economia brasileira terá um trágico efeito na continuidade da atual estratégia anti-inflacionária. Na medida em que as reformas estruturais tardam — e, assim, tornam-se cada vez mais difíceis de serem concretizadas —, restam ao governo apenas as providências conjunturais de política econômica, de curto prazo, tais como elevação de juros e medidas administrativas para monitorar o mercado cambial e o nível de demanda agregada. Sobem os juros cortam-se prazos de crédito, aumentam-se os compulsórios, restringe-se o movimento de capital, reduzem-se impostos aqui, aumentam-se acolá.

Qualquer analista econômico percebe, nitidamente, o rápido esgotamento dos instrumentos à disposição do governo para domar a inflação. O Plano Real foi implementado de cabeça para baixo. A primeira fase de um plano de estabilização — que seriam as reformas estruturais que eliminariam as pressões primárias da espiral inflacionária — foi jogada para a última etapa por um Congresso que se mostrou incapaz e irresponsável, ao refugar diante da reforma da Constituição. O Plano Real extirpou magistralmente a inércia inflacionária. Mas não aguentará mais seis meses de inflação mensal de 3 70.

O ponto fundamental é que a política econômica do governo, hoje, se resume em não deixar a economia crescer. Remédio amargo, mas aceitável diante da perspectiva de imediata ação contra as fontes primárias da inflação. Mas totalmente inaceitável, caso a nova administração caminhe no sentido da indecisão e da procrastinação.

 

MARCOS CINTRA, doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA), e professor titular da Fundação Getulio Vargas.

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