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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

A Sarneyzação de Collor

A sensação clara é a de um governo imobilizado. O estilo é agressivo, repleto de planos, buscando constantemente eventos políticos e econômicos para capitalizar a seu favor. No entanto, o resultado é melancólico. É o retrato de um governo que perde prestígio e fica cerceado em suas ações.


As condições de governabilidade do Presidente Collor estão se deteriorando rapidamente. O programa de estabilização se desintegrou em questão de semanas. O principal erro na condução da política antiinflacionária foi o aumento excessivo da oferta de moeda, permitindo a conversão desenfreada de cruzados novos em cruzeiros. Essa brecha levou a um colapso iminente.


Com a retomada das expectativas inflacionárias, surgiram enormes lacunas na estratégia antiinflacionária do governo. O plano tinha sido imposto de maneira extremamente autoritária, com o governo evitando contestações mesmo quando a legalidade de algumas medidas estava em questão.


Quando as expectativas se inverteram, todas as bases de sustentação do Plano Collor, que em última instância dependiam da redução da inflação, desmoronaram à medida que as pressões inflacionárias, ainda que limitadas, ressurgiram no início de maio.


O Judiciário deixou de apoiar todas as imposições do Executivo. Na questão do efeito suspensivo dos dissídios trabalhistas, na medida provisória 190, as decisões que contrariam o princípio do congelamento dos ativos financeiros se tornaram comuns.


O Legislativo também parou de apoiar as propostas do governo da mesma forma que antes. Rejeitou a medida provisória 185, que restringia as decisões da Justiça trabalhista. O Congresso agora age em desacordo com os interesses do governo, inclusive quando discute uma nova política salarial, apesar do descontentamento das autoridades econômicas.


No campo da privatização, o governo enfrentou resistência das instituições financeiras e recuou na imposição dos Certificados de Privatização. A reforma administrativa do setor público não está progredindo no ritmo prometido, frustrando mais uma iniciativa de impacto do governo.


Pressões por reindexação econômica estão surgindo de todos os lados, e as autoridades não parecem capazes de contê-las. Apelos para entendimento entre governo, empresários e trabalhadores têm sido infrutíferos.



MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 43 anos, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), diretor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas e consultor de economia da Folha.

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